Convenhamos, ele é o cara certo na hora certa. Seus livros não têm nada demais, os roteiros parecem cópias uns dos outros, mudando somente alguns dados dos personagens, as tramas são simples e esquemáticas, mas o cara enche o rabo de dinheiro, vende zilhões de cópias e todo mundo gosta, inclusive eu. É hora de seguir a onda e ganhar dinheiro com isso, então escrevi e compartilho com vocês o Manual de Redação Dan Brown: |
Manual de Redação Dan Brown
O Protagonista:
O protagonista é sempre um profissional destacado (sem ser celebridade) dentro de sua área. O bastante para ser respeitado, mas nunca um dos líderes. Deve ser ficar na casa dos quarenta. Solteiro, com uma história de decepção amorosa / tragédia pessoal.
A área de atuação não é charmosa o bastante para gerar um personagem interessante por si só, como piloto de caças ou chefe de esquadrão anti-bombas, mas não é monótona o bastante para se tornar impossível de glamourizar, como Analista de Sistemas ou Contador.
O protagonista tem padrões éticos distintos. Fugindo dos vilões não pára nem por um segundo para admirar a parceira e pensar “bela bunda”, como todo humano normal.
A participação do protagonista é sempre legítima. Ele deverá ser convocado para participar da trama, geralmente pelo próprio vilão, que o usará como sustentáculo de uma “versão plausível” da trama, desviando as autoridades do real e nefasto motivo do crime. (sim, sempre há um crime).
O vilão sempre terá uma assistente / subordinada solteira, bem-sucedida mas ainda em busca de seu propósito. Ela terá uma ligação íntima com o vilão (se não é o vilão aguarde, no final do livro ele irá se revelar) mas não hesitará em se aliar ao herói, mesmo tendo conhecido este cinco minutos atrás. Ela TAMBËM tem uma profissão nos moldes do protagonista, mas em área totalmente distinta.
Há sempre um vilão falso, para quem todas as indicações apontam, até a virada crucial no terço final do livro. Na verdade ele sempre é inocente.
A Trama:
O template Dan Brown (provavelmente disponível na nova versão do Microsoft Office) pode ser definido assim:
- 1 – Crime / fato relevante acontece. Sempre um fato que irá mudar profundamente a face da Terra.
- 2 – Teoria Falsa #1 apresentada, com vilões e coadjuvantes sendo introduzidos
- 3 – Protagonista cai de pára-quedas, imediatamente compra a teoria falsa; percebe a coadjuvante
- 4 – Protagonista começa a desconfiar da teoria falsa, junto com outros especialistas bonzinhos desenvolve n+1 teorias alternativas.
- 5 – Coadjuvante / interesse romântico descobre a informação crucial que fará desmoronar a teoria falsa; conta para o vilão verdadeiro.
- 6 – Vilão descobre que a teoria vai ser desmascarada. Tenta matar (ou mata) o vilão falso, seguido do protagonista. Alguns camisas-vermelhas morrem, mas nunca o protagonista e a coadjuvante.
- 7 – Assassinos profissionais são derrotados pelo protagonista e seu insuspeito conhecimento dentro de sua área técnica, vilão verdadeiro morre, Teoria Falsa #1 desmascarada, o mundo continua como antes. Protagonista dorme com a coadjuvante, câmera se move pra lareira.
As Teorias:
Os livros Dan Brown usam um bom truque; ele faz uma pesquisa rápida (no Google provavelmente) sobre qual a teoria da moda, seja fusão fria, antimatéria, criptografia, religião ou o que quer que o Fantástico paute pra semana que vem. Após um período considerável (5 minutos, dada a superficialidade dos textos) ele compila material para criar um tema “e se..”. De posso disso, aplica o roteiro acima e voilá: mais um best-seller instantâneo.
Qualquer página de Teorias da Conspiração fornece material para dezenas de best selers. Ele ainda não fez nenhum sobre OVNIs, mas aposto as fotos do menage que fiz com a Sandy e a Luciana Vendramini que ele lancará um em breve.
Nota: Óbvio que essas fotos não existem, mas confio no meu taco. Se o Dan Brown NÃO lançar um livro sobre aliens, eu IREI fazer um menage com a Sandy e a Vendramini, e aí será o Segundo sinal do Apocalipse.
Os Truques:
Acho que foi P.T. Barnum que disse que ninguém nunca perdeu dinheiro subestimando a inteligência alheia, mas Dan Brown faz isso de forma brihante; ele faz o leitor se achar muito mais inteligente do que é.
Bons cineastas criam cumplicidade com o público respeitando sua inteligência. Um filme com referências, veladas ou não, consegue muito mais simpatia que uma obra única e fechada. Nem precisa ser a brincadeira trekker na abertura de Kill Bill, detalhes simples tornam a experiência pessoal. Todo mundo da minha geração que reconheceu o intercomunicador original d’As Panteras no primeiro filme deu um sorriso de aprovação.
Em livro isso é mais complicado, então Dan Brown seguiu outra linha; ele explica a trama mas dá ao leitor a oportunidade de confirmar independentemente. Não é preciso ser um pesquisador do Instituto Smithsoniano, ele se baseia sempre em “provas” simples e acessíveis. Todo mundo (no ocidente) tem uma bíblia em casa, é fácil achar as passagens misteriosas (afinal de contas ninguém lê aquele calhamaço mesmo) e soltar um “caramba, é verdade”.
No livro sobre criptografia ele demonstra algumas cifras simples; todo mundo pega papel e lápis e sai se achando James Bond…
Muito melhor do que se basear apenas na fé ou na suspensão de incredulidade. Nem Tolkien conseguiu isso…
Outro truque clássico é a reversão de expectativas. O vilão é sempre mascarado. Você até desconfia dele um pouco mas todos os fatos apontam para OUTRO. Quando o vilão começa a ser perseguido, o leitor tira da cabeça a idéia de que ele seja vilão. Isso só é revelado perto do final.
As Organizações:
Os livros nunca são sobre a Associação Americana de Contabilidade ou o Instituto Romeno de Ensino à Distância. Dan Brown sempre escolhe uma organização famosa (CIA, NASA, Vaticano, NSA) com uma agenda própria. Também escolhe uma organização secreta (desde que com página na internet) para fazer contraponto. Pode ser um grupo mais obscuro, como os Illuminati ou algum tão famoso que tenha sede própria, mas ninguém fora do meio ouça falar, como a Maçonaria ou o Opus Dei.
Aguardem em breve um livro de Dan Brown sobre os Templários.
Os processos internos são descritos razoavelmente bem, em geral são curiosos para os de fora. A sensação de estar espiando pela janela uma vizinha trocando roupa é ótima, somos todos Voyeurs.
As Pesquisas:
Ao contrário do Michael Crichton, como bem observou o Bernard, Dan Brown não tem muita paciência pra pesquisa. Crichton vai fundo, chega a passar anos aprendendo algo antes de fazer um livro. Mesmo suas obras ruins, como “Prey” e “Timeline” são muito mais bem embasadas do que as do Dan Brown. “Enigma de Andrômeda” é um dos clássicos da Ficção Ciêntífica, “WestWorld”, que ele inclusive dirigiu é um dos melhores filmes de robôs já feitos. Por isso décadas depois ainda se fala nele.
Curiosamente o mercado parece gostar da superficialidade do Brown, pois permite que literalmente dezenas de livros contestando suas idéias sejam escritos. Eu ganho, você ganha, nós ganhamos, estamos todos felizes.
A Conclusão:
No melhor estilo Dan Brown, a reviravolta: Eu não desgosto dos livros dele. Em termos de entretenimento são ótimos. Leitura rápida, você fica esperando a conclusão sabendo que algo vai se reverter mas sem pensar muito para não deduzir quem é o vilão… os temas são interessantes, as cenas são bem descritas. EU fiquei excitado com a cena do Anjos e Demônios da Biblioteca do Vaticano. Quem ama livros sabe o que seria entrar ali.
Recomendo Dan Brown sem ressalvas. Nem tudo que você lê tem que mudar sua vida. Você pode se divertir SIM com um livro despretensioso. NÃO vou cair na tentação dos pseudo-intelectuais fruto de botequim de faculdade de classificar como “literatura de segunda”. Não é. É literatura, ponto. Lê quem quer.