Abelardo Barbosa foi muito mais que um criador industrial de chacretes para a indústria do abate. Ele foi o maior comunicador que o Brasil já teve e só não foi o maior comunicólogo por provavelmente preferir abater chacretes a escrever livros. Ele entendeu como ninguém a Televisão, e disfarçadas de máximas e piadas sua sabedoria perdura até hoje.
Chacrinha entendia algo que escapa a muitos entendidos hoje em dia: Comunicação de massa é sobre pessoas, não sobre tecnologia. Não importa o meio, não importa a mensagem (sorry, McLuhan) o que importa são as pessoas. A dinâmica de um auditório não é diferente de um perfil popular no Snapchat. Eu sempre bato na tecla de que podcasts são rádio AM feito por gente que nunca ouviu AM na vida, mas deveria.
O fogo das novas mídias matando as velhas é outro fenômeno que só existe na mente dos “estudiosos”. Pode ver, assim que surge uma nova rede social dois dias depois aparece alguém escrevendo sobre o “nova rede social killer” que aponta na esquina. A TV HD afinal vai matar o cinema, que virou widescreen para matar a TV que por sua vez porá fim ao rádio, que matou totalmente os livros, que são o prego no caixão do teatro…
Uma dessas crônicas de mortes mal-anunciadas que figura entre as minhas preferidas é a televisão morrendo na mão do Video On-Demand, morrendo na mão da Netflix. O conceito é simples: Horário Nobre deixará de existir, a audiência seria pulverizada pois todo mundo assistiria aos programas no horário mais conveniente. Power to the People, o povo não é bobo abaixo a Rede Globo, barões da mídia não mais definirão nossos hábitos e horárioszzzzz….
Não funciona assim. Somos criaturas ansiosas. Queremos tudo e queremos agora. A Netflix conseguiu combater com sucesso a pirataria ao disponibilizar suas séries ao mesmo tempo no mundo todo. Fãs exigem e conseguem que seriados saiam o mais rápido possível em relação aos países de origem.
Em época de Game of Thrones ou Walking Dead chega a ser cômico nas interwebs os fãs desesperados atrás de boas almas que abrem um streaming pirata. A ansiedade de ver o episódio assim que ele é liberado faz com que gente com lindas TVs 4HD mega-power HDR Plus 2000 assistam streamings filmados com uma batata e transmitidos em uma banda mínima.
Não importa que o conteúdo vá estar disponível em alta qualidade minutos após a exibição, aqueles minutos são essencial. Sem eles o fã perde a experiência coletiva (a TV vai matar o cinema, lembra?). Assistir sabendo que um monte de outras pessoas, conhecidas ou não está compartilhando a experiência é mais importante do que qualidade de som e imagem.
“Ah mas o YouTube muda isso”
Chacrinha já dizia: “Na Televisão nada se perde, nada se cria, tudo se copia”. A Internet manteve essa regra funcionando. O YouTube começou como uma grande locadora, mas hoje ele é mais TV do que qualquer outra coisa. De novo, não importa se o vídeo estará lá para nossa conveniência. ASSIM QUE SAI um vídeo de canais que gostamos muito, corremos para assistir.
É normal, quando sai um novo History Buffs eu paro o que estou fazendo e vou assistir. Agora o YouTube deu um passo adiante para se tornar indistinguível da televisão: As Lives. Não há nada mais sem-sentido que vlogueiros fazendo lives no YouTube, em geral estão jogando conversa fora, mas é o que o povo gosta. O sujeito passa 40 minutos filosofando sobre um nada, mandando um monte de beijos pro meu pra pra minha mãe e pra você, e chegam a milhares, em alguns casos a dezenas de milhares de espectadores.
Funciona assim: O Felipe Neto faz uma live e tem mais audiência que quase todos os 150 canais da Sky. É a anti-televisão, mas é o que o povo quer, é o que o povo gosta. Já lives arquivadas? Qual a graça?
No Ano do Senhor de 2017 a Internet repete os hábitos da TV, criados quando não havia videotape, na verdade criados quando ela ainda era rádio. Esses hábitos, para desespero dos Militantes Revoltados não vêm de cima, mas de baixo. São criados pelos próprios espectadores, e as mídias se adaptam a eles. O Instagram, um aplicativo criado para compartilhar fotos do almoço agora também tem lives. Facebook tem lives, Twitter tem lives. De mensagens de 140 caracteres a um meio de transmitir vídeo em tempo real de qualquer lugar do mundo.
O segredo para dominar o futuro é entender o passado. Não importa a rede social que inventem, o foco sempre serão pessoas, e pessoas não mudam. Quer dominar a Internet? Pare de querer reinventar a roda. Estude e aprenda com a televisão e o rádio. E sim, eu sei que eles estão em situação precária, mas não temos culpa se são burros demais para entender que já detém as respostas.