We don´t need another hero só que não

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Com especiais agradecimentos à Ned, a governanta alemã misto de parteira que extraiu este texto a fórceps.

Eu sei que pode soar inacreditável, mas eu não sou o poço de simpatia e sociabilidade que muita gente imagina. Isso já me causou constrangimento e -pasmem- me fez ser deselegante com outras pessoas.

E isso não é de hoje, em 96, 97 eu já curtia essa onda de misantropia e me orgulhava de um dia ter sentado no ônibus do lado de um sujeito que estava lendo um de meus livros. Nem pensei em apontar “fui eu quem escrevi”, apenas fiquei celebrando como era bom ganhar dinheiro de forma anônima.

Sim, eu fui extremamente babaca, e ao nerd que eu esnobei, peço desculpas.

Mesmo assim eu não conseguia entender como alguém poderia se interessar por um autor dessa forma. Uma vez minha editora montou um stand na Feira do Livro, em SP, e eu fui de autor convidado. As pessoas vinham, pediam autógrafo, batiam papo, eu recebia bem, mas não entendia.

A relação fã/artista me era estranha. Sim, claro que eu tinha pessoas que admirava, escritores como Richard Bach, cientistas, mas nunca me colocaria como “fã”.

Eu acho que esse cinismo é natural do Carioca, no Rio a gente é adestrado para ignorar qualquer tipo de celebridade. O Papa pode sentar na mesa ao lado e pedir um chopp, e se ele olhar o máximo que recebe é um aceno de cabeça.

Quando comecei isso de escrever pra blog, leitores começaram a aparecer, mas eram só nomes em formulários de comentários. Eu ainda tinha a ilusão de que estava vivendo minha vida antiga, escrevendo para o vazio, eu não havia percebido que a Internet assim como o Gianechini é uma via de mão dupla, e não há nada de errado nisso.

Como eu mesmo não dava muito valor ao meu estado de blogueiro, nunca me deslumbrei, nem quando virei “blogueiro famoso”, então não percebi que eu convivia com gente que a maioria dos leitores não conhecia.

Uma vez durante um lançamento da Microsoft, com todos os suspeitos habituais, tipo Nick Ellis, Inagaki, Fugita, etc, o Marcelo Tas era o apresentador. Estava todo mundo numa roda de bate-papo, quando uma jornalista conhecida minha me chamou.

Ela ficou sem acreditar: “Você conhece o Tas?”

“Não de passar a mão na bunda, mas a gente se fala de vez em quando, quando se esbarra”

A moça unhou meu braço desesperada “me apresenta por favor eu faço tudo que você quiser”

Óbvio que ela estava brincando, mas eu fui burro ou elegante o suficiente para não considerar a oferta, levei a menina até o Tas, a introduzi (no bom sentido) e segui adiante.

Nessa época eu já entendia que ter leitores, fãs, era inevitável, e eu não os via como incômodo, isso nunca fiz, mas percebi que eu estava com medo de ficar eu mesmo deslumbrado, tipo aquelas vlogueiras que vão a eventos cercadas de seguranças e ninguém dá bola pra elas do mesmo jeito.

Era difícil conciliar uma saudável dose de misantropia com timidez e um tico de viralatismo, até que descobri um truque: Para vencer a timidez era só fingir que não era tímido. Eu não iria deixar de ser tímido, mas eu podia imaginar como eu agiria em determinada situação se não fosse.

Por isso eu subia em palco do YouPix sem estar (completamente) bêbado.

YouPix 2016, ao menos na minha imaginação

Sem a timidez atrapalhando, eu me senti confortável para ouvir e entender as pessoas, e isso mudou tudo. Conheci leitores incríveis, fiz grandes amizades e algo mais, mas um cavalheiro não comenta, já dizia o Ziraldo.

Lembro de uma moça que me procurou em um evento para tirar uma foto, e ela estava legitimamente tremendo. Sem exagero ou figura de linguagem. Ela tremia por estar ali falando comigo.

Meu eu de 20 anos atrás iria rir, explicar que não tinha nada a ver, que ela estava sendo besta, eu era só um idiota que escrevia bobagens na internet, e meu humor autodepreciativo a arrastaria para o fundo junto comigo.

O que eu entendia agora é que como EU me enxergava não importava. Ela estava na presença de alguém que escrevia coisas que ressoavam, coisas com as quais ela concordava, coisas que a fizeram mudar de idéia, coisas que ela não gostava, mas a faziam pensar.

Eu seria um babaca egoísta por tirar esse momento dela.

Não há nada de errado em ser fã de alguém, tietar é bonito, tietar é gostoso. Conheço uma jornalista gatinha que é fã desesperada pelo Daniel, o cantor. A coisa mais fofa do mundo é quando eles interagem no Instagram.

No Twitter isso se tornou muito mais comum, com raras exceções “famosos” e fãs interagem constantemente, mesmo entre si, e um dos momentos mais legais que vi esse ano foi quando a Mariana Belém estava toda boba porque o Felipe Neto havia mandado uma mensagem para as filhas dela.

Eu posso falar um monte sobre tudo de errado na cruzada pseudo-moralista de Felipe, e também poderia reclamar que a Mariana é legitimamente famosa, nasceu e cresceu entre celebridades (tecnicamente ela nasceu entre uma celebridade, que horrível apagar) e não deveria se deslumbrar.

Mariana Belém – imagem meramente ilustrativa apenas para quem não está conseguindo ligar o nome à pessoa da mãe.

Só que as meninas não sabem disso. As meninas são da geração YouTube, os ídolos delas estão na tela do celular, e mesmo que seja aquela foca idiota, é de quem elas gostam. Na escola ninguém liga que a mãe puxa o telefone e em cinco minutos elas estão falando com o Sílvio Santos ou o Monteiro Lobato (a Mariana conhece um médium porreta). O Felipe Neto mandou mensagem pra elas e isso é o que importa.

Hoje ainda me admira que eu tenha gente colaborando financeiramente com o blog (o complexo de vira-lata nunca some) mas eu aprendi a apreciar o efeito de meus textos, já recebi mensagens de gente que escolheu carreiras em Ciência e Tecnologia por minha causa.

Isso sim é ser influenciador, motherfuckers, não fazer alguém mudar de marca de batom.

Como disse Steve Jobs, deixe uma marca no Universo, ou você quer passar o resto da vida vendendo água com açúcar?

Por outro lado, também me sinto mais livre pra tietar, é inacreditável poder assistir a um filme ou série, ler um bom livro ou artigo, ir para o Twitter e agradecer pessoalmente ao autor.

Isso não tem preço, e ainda por cima eu dei sorte, nunca encontrei nenhum babaca como o Cardoso de antigamente.


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