Sejamos realistas: O afegão médio, em qualquer lugar do mundo não é muito inteligente, por isso na maioria das vezes o povo tem o governo que merece, mas em alguns raros casos o povo tem o governo que precisa, e ajuda esse povo burro a se proteger de si mesmo.
Um desses governantes foi Frederico o Grande (1740 – 1786), que reinou sobre a Prússia por 46 anos. Ele foi um monarca que investiu em obras, ciência, artes. Frederico abriu o país para imigrantes de várias fés e origens, e protegeu o país sendo um grande militar estrategista.
Frederico também era inegavelmente, indesculpavelmente, irrevogavelmente gay. Quando menino teve um caso com um pajem, descarado a ponto de até as irmãs desaprovarem, e não tem nada mais cúmplice de boyzinho gay do que irmã.
Depois de alguns escândalos ele foi forçado a se casar com uma tal de Elisabeth Christine of Brunswick-Bevern em 1733, para abafar o segredo mais conhecido da Prússia. 7 anos depois o Rei, pai de Frederico morreu, ele se divorciou da mocréia e assumiu. O trono.
Daí foram constantes festas em sua corte exclusivamente masculina; ou seja, Frederico não tinha cortesãs, só cortesões.
Zoeiras à parte, Frederico era um excelente governante, e a ausência de herdeiros e concubinas dava a ele muito mais tempo livre para cuidar da Prússia, principalmente quando ficou evidente que com o influxo de imigrantes a Prússia teria um problema sério para alimentar seu povo. Pausa para as batatas.
Hoje a gente não consegue dissociar a Europa de batatas, seja fazendo piadas com irlandês (too soon?) ou lembrando de excelentes pratos portugueses e alemães, além das magníficas batatas-fritas, criadas na Bélgica, mas as batatas são nativas das Américas, foram levadas para a Europa como uma espécie de Pocahontas (também) de comer, precisamente em 1565 por Gonzalo Jimenez de Quesada.
Se em 2020 o populacho está lacrado na cloroquina e no termômetro no pulso, imagine no Século XV. Por décadas as batatas eram uma curiosidade, usadas para alimentar animais e mais nada. Os camponeses tinham nojo delas, aquelas coisas feias sujas de terra. As pessoas literalmente passavam fome, mas não comiam batatas, algumas vezes com respaldo teológico.
A Igreja Ortodoxa Russa proibiu que seus fiéis comessem batatas, com o brilhante argumento de que elas não eram mencionadas na Bíblia.
Na Prússia, o Rei Frederico, que não era bobo, já estava de olho nas batatas, e em 1744 as introduziu (epa) em suas tropas, e como soldado não tem que apitar, aceitaram a planta esquisita nas rações, e gostaram, a ponto de rolarem brigas épicas pelas batatas.
Em 1774, a Prússia passou por uma fome sinistra. Safras ruins, muita população, carestia, era preciso algo para complementar a cesta básica do povão. Frederico imediatamente lembrou das batatas, que dariam uma trégua no preço do trigo, abaixando o custo do pão.
Só havia um problema: O Governo mandou que a população plantasse batatas e a população mandou o Governo plantar batatas. Ninguém queria nada com aqueles tubérculos esquisitos.
Uma frase famosa da época sobreviveu até hoje:
“As coisas não têm cheiro nem gosto, nem mesmo os cachorros querem comê-las, que uso elas têm para nós?”
Frederico, como todo bom monarca absolutista ameaçou cortar nariz e orelhas de quem não cumprisse a ordem real, mas não adiantou.
O povo em vias de passar fome, mas com nojinho besta das batatas, não querendo nada com elas nem sob ameaça. Como resolver o problema?
MARKETING.
O Rei Frederico, conhecedor da mente humana, formulou um plano genialmente simples, idéia tida provavelmente depois que ele assistiu o episódio d’Os Simpsons onde Homer compra um trampolim.
Em propaganda a gente aprende que existe valor real e valor percebido. O valor real é o custo de produção de um produto, o valor percebido é quanto o consumidor acha que ele vale. No meio disso tem o preço pago pelo produto. Assim o sujeito comprava um Miúra, com carroceria de fibra e motor de Brasília, e todo mundo em volta achava que ele tinha um carro esportivo.
Para fazer com que o consumidor pague mais que o valor real do produto, você precisa convencê-lo que o valor percebido é igual ou maior que o preço de venda. Existem vários métodos para isso, nem todos funcionam, mas um dos mais antigos é associar o produto a figuras populares, assim o consumidor se sente igual ao garoto-propaganda, ao influencer famoso.
Isso é tão antigo que literalmente na Roma Antiga gladiadores tinham contratos de publicidade e seus nomes e imagens apareciam em cartazes promovendo lanchonetes, armeiros, restaurantes.
Frederico, sabendo disso mandou construírem uma Plantação Real de Batatas, que foi devidamente cercada e protegida por guardas armados. As batatas agora não eram mais uma planta esquisita que só boi comia, eram uma iguaria do Palácio Real, tão valiosa que era protegida por soldados.
Resultado: Os camponeses ficaram de olho grande, na calada da noite invadiam a plantação para roubar batatas e, como aquela sua tia chata que insiste em parar no meio da estrada, “pegar uma mudinha”. Os guardas, instruídos a fazer vista grossa, fingiam que não era com eles.Logo os camponeses “espertos” estavam experimentando receitas, fazendo plantações escondidas de batatas e tirando onda que comiam o mesmo que o Rei.
A Prússia se livrou de uma grande fome, um novo alimento, excelente fonte de carboidratos passou a fazer parte da dieta da população, e com a vantagem de crescer em qualquer canto, até em Marte, dizem.
Em 17 de Agosto de 1786, aos 74 anos Frederico, o Grande morria em paz. Seu último desejo foi ser enterrado junto ao túmulo de seus cachorros, no Palácio de Sanssouci, mas seu sobrinho e sucessor, Frederico Guilherme II, preferiu colocar seu caixão em uma igreja em Potsdam, junto com o pai, Frederico Guilherme I.
Sim, eu sei, a ordem é Frederico Guilherme I, Frederico o Grande e Frederico Guilherme II. O Rei Frederico era coluna do meio. OK OK parei, assim como Family Guy juro não mais fazer piadas gays.
Frederico o Grande tinha admiradores inusitados, inclusive Hitler; ele era visto como um exemplo de líder, comandante militar, unificador e expansionista, a ponto do Führer em pessoa ordenar que os caixões com os corpos de Frederico, o pai e outros dignatários fossem removidos da igreja e protegidos em uma mina de sal.
Ele era visto com tanta reverência pelo Alto-Comando alemão que mesmo sendo abertamente gay, algo que era ilegal na Alemanha Nazista na década de 1940 (e em 72 países no mundo de 2020) Frederico o Grande continuava sendo venerado como um grande homem.
Isso aliás gerou problemas póstumos, vários acadêmicos decidiram que se Hitler gostava muito dele, algo de errado deveria haver, mas com o tempo a reputação de Frederico foi reabilitada pela História, assim como seu corpo.
Depois de várias idas e vindas, finalmente, depois de muita milhagem em 1991 o último desejo de Frederico o Grande foi atendido: Ele foi sepultado em Sanssouci, sem nenhuma pompa, em uma tumba simples.
Com isso, uma velha tradição foi reiniciada. Em agradecimento, descendentes dos súditos do tempo de Frederico depositam flores e batatas em sua sepultura.
Fontes:
- Frederick the Great
- Frederick the Great, potatoes and the art of rebranding
- Ask MHQ: King Frederick II of Prussia
- Frederick the Great: King of Prussia
- The History and Social Influence of the Potato