Era 1945. Em uma fábrica perto das praias de Ichinomiya, no Japão, trabalhadores produziam hidrogênio em uma fábrica próxima, quando centenas de bombas começaram a cair, sem aviso, lançadas por bombardeiros americanos B29, decolando das Ilhas Marianas.
A principal responsável pelo ataque não era militar, mas uma geóloga chamada Julia Anna Gardner, que resolveu um dos grandes enigmas da Guerra: A origem dos Balões Fu Go.
Na época foi um dos segredos mais bem-guardados da Guerra. Durante cinco meses, começando em novembro de 1945, começaram a acontecer incêndios e explosões na costa oeste dos Estados Unidos, e inicialmente ninguém tinha idéia das causas. Investigações descobriram restos do que seriam balões de seda, com marcações japonesas.
Os chamados Balões Fu Go eram os mísseis intercontinentais da época; um equipamento de alta tecnologia capaz de atingir o território continental dos Estados Unidos, viajando dez mil quilômetros.

Eles consistiam em um balão de dez metros de diâmetro, cheio de hidrogênio. Uma série de válvulas e barômetros deixavam vazar o hidrogênio em excesso durante o dia, quando o Sol esquentava o balão e aumentava a pressão, e durante a noite hidrogênio de um reservatório era injetado para aumentar a flutuabilidade, quando o frio fizesse o balão encolher.
Os barômetros também controlavam acionadores explosivos que deixavam cair sacos de areia com o lastro, caso o balão estivesse muito baixo.

Em média eles levavam 60 horas atravessando o Pacífico, o que intrigou os investigadores americanos. Na época eles não conheciam a Corrente de Jato, uma região nas altas (e baixas) latitudes, que forma uma espécie de “rio” na atmosfera, entre 9 e 12km de altitude. Essa corrente pode ultrapassar os 300Km/h, e os japoneses a conheciam. Por isso seus balões viajavam tão rápido.
O plano original era lançar os balões com bombas antipessoal e incendiárias, para queimar grandes florestas nos EUA. Mais tarde cogitaram enviar armas biológicas, desenvolvidas na Unidade 731, mas a Guerra acabou antes que conseguissem.
Dos mais de 9000 lançados, somente uns 300 chegaram aos EUA, Canadá e México, e somente seis vítimas fatais foram atribuídas a eles. Uma família que estava fazendo um piquenique no Oregon, acharam um balão Fu Go caído e foram mexer para ver o que era.
Infelizmente traçar a origem dos balões no Japão não ajudava muito. Os EUA não tinham uma grande rede de espionagem local, então o jeito foi pensar fora da caixa. Muito fora da caixa.
Eles chegaram até o Serviço Geológico dos Estados Unidos, uma organização cheia de nerds que não entendiam nada de guerra, mas entendiam de outras coisas, como… areia.
Alguém teve a idéia de que a areia usada como lastro poderia dar alguma indicação sobre a origem dos balões, e se isso parece uma apelação de um episódio ruim de NCIS, bem, a realidade pode exagerar o quanto quiser.
Entre os nerds havia uma coroa chamada Julia Anna Gardner. Nascida em 1882, ela era por si só um prodígio; uma mulher cientista conceituada nascida em uma época em que mulheres não podiam nem votar.

Formada em 1905, Julia conseguiu seu mestrado em 1907, especializando-se em paleontologia e geologia. Em 1911 ela se tornou a primeira mulher a conseguir um PhD. Em geologia pela Universidade John Hopkins.
Durante a Primeira Guerra Mundial, ela trabalhou na França como enfermeira voluntária. De volta aos EUA, se junto ao Serviço Geológico, estudando estratigrafia e moluscos.
Quando a Segunda Guerra estourou, Julia já estava estabelecida como uma das maiores autoridades mundiais em sua área, e não pensou duas vezes quando o Exército montou a Unidade Geológica Militar, um grupo com 88 geólogos, trabalhando em conjunto com os planejadores e estrategistas.
Falando assim não parece fazer muito sentido um nerd geólogo colaborando com militares, mas eles foram importantíssimos. Antes da Invasão da Normandia, membros da Unidade foram enviados para as praias, coletando amostras e determinando se o solo era firme o suficiente para suportar o peso dos tanques aliados.
Quando o problema dos balões chegou à Unidade, eles rapidamente determinaram que a areia não era compatível com as praias americanas. Julia Anna Gardner então começou a estudar em mais detalhes a amostras.

Com seus conhecimentos enciclopédicos, ela confirmou que a areia era japonesa; escondidas entre os grãos havia amostras microscópicas de esqueletos de diatomáceas, algas microscópicas que criam um exoesqueleto com sílica, que deixam para trás quando morrem.

Cientistas amam diatomáceas, amostras de solo trazem as algas da época, e elas mudam de acordo com a Evolução. Isso é perfeito para datar uma amostra de solo. Das 25 mil espécies conhecidas, as amostras continham 100 espécies diferentes, muitas descritas em Papers científicos japoneses.
Elas também variam de acordo com a região, partes diferentes do planeta apresentam espécies diferentes de diatomáceas, e Julia conhecia exatamente de onde as algas na areia dos balões se originavam.
Ela criou um mapa com as localizações prováveis, e o alto-comando achou bom o suficiente para justificar um ataque.

Nem todos os pontos foram bombardeados, mas o ataque principal foi suficiente para tirar de ação boa parte das unidades de balões, Em abril de 1945, sem recursos e sem saber se os balões haviam causado algum dano real, os japoneses encerraram o programa.
Depois da Guerra, Julia foi para o Japão, onde encontrou cientistas e estudantes, apresentou palestras e incentivou os pesquisadores a continuar seus trabalhos, pois Ciência e Tecnologia eram as únicas coisas capazes de prover um futuro melhor para o país devastado pela guerra.
Julia faleceu em 1960, aos 78 anos, em sua casa em Maryland.

Fontes:
- Diatom
- Julia Anna Gardner (1882-1960), Ph.D.
- Forgotten women of Paleontology: Julia Anna Gardner and the Dungeon Gang
- Julia Anna Gardner
- How Geologists Unraveled the Mystery of Japanese Vengeance Balloon Bombs in World War II
- Fu-Go balloon bomb



