Eu sou meio burro. Falo que vou postar o livro em formato de folhetim, mas esqueço de que pra isso preciso postar… O TEXTO, e não só disponibilizar para download.
Sem contar que o Google não vai indexar meus EPUBS. Portanto, aqui está. Quem preferir baixar, é só visitar este link.
John Chosen
A Trilogia
Ou:
A SAGA DA ESPADA ÉPICA DO DRAGÃO-DINOSSAURO DA JÓIA DO REINO DOS LOBOS-VAMPIROS GUARANIS
Um “livro” de Carlos Cardoso
Copyright © 2015 Carlos Cardoso
Todos os direitos sobre o texto reservados.
Ebook de distribuição gratuita. Venda proibida
1ª Edição – Junho 2015
A Culpa é das estrelas do Andy Weir
Eu confesso, não esperava publicar esta história tão cedo.
A Saga do John Chosen começou como uma brincadeira, e foi crescendo, crescendo e absorvendo meu tempo livre, mas nunca foi um livro “sério”. Ainda não é, mas no bom sentido. É uma bobagem divertida, que quero botar na rua o mais rápido possível, como um filho que fez 18 anos.
Eis que me deparo com uma entrevista com Andy Weir, autor do excelente Perdido em Marte, livro que aliás você deveria estar lendo no lugar deste. Andy conta que inicialmente seu livro foi disponibilizado em formato de folhetim, coisa muito comum nos primórdios da literatura comercial.
Em essência você serializa uma história publicando capítulos sequencias em um jornal ou revista. Isso pode ser feito com obras originais, que depois são ou não transformadas em livros, ou com textos já consagrados, divididos em partes e publicados em sequência.
A prática funciona desde os tempos Vitorianos, e se é boa o suficiente para Alexandre Dumas, Tolstoi, Conan Doyle, Charles Dickens, Tom Wolfe, Stephen King e Andy Weir, é boa para Carlos Cardoso.
Irei disponibilizar semanalmente no Contraditorium.com novos capítulos, e ao final, claro, lançarei a versão completa e revisada. Por isso não há índices e outros frufrus, esta é uma obra em andamento, você encontrará erros, inconsistências e será lembrado que livros política e linguiça quem gosta não deve ver como são feitos.
Pode ser que o resultado seja uma bomba e eu só saiba escrever sobre buracos de duplo sentido, mas também pode ser que eu seja o único a achar engraçadas as bobagens que você lerá aqui.
Só há um jeito de saber: Lendo o livro, e aí antes você do que eu ;)
Passando a Sacolinha
Este livro é gratuito. Não me sinto bem cobrando por uma história intencionalmente ruim, que ainda está sendo escrita e que está sendo tão divertida para mim, é quase uma terapia.
Mesmo assim estou tendo um trabalho considerável de edição, adaptação e formatação. Isso está consumindo tempo que eu poderia usar escrevendo material remunerado. Material novo que você, leitor do Contraditorum e do MeioBi, também gosta.
Principalmente, eu estaria violando a regra do Dr Samuel Johnson, que conheci tantos anos atrás, na parede de meu primeiro editor:
“No man but a blockhead ever wrote, except for money.”
Eu não sou um blockhead, e se não posso cobrar, nada me impede de pedir.
Se você gosta do meu material, se este livro rendeu algumas horas de diversão, se você quer que eu produza mais material assim, com textos inéditos ou mesmo outros estilos, colabore.
Ficarei muito feliz com qualquer trocado. Você pode me pagar um Chopp, um BigMac, um Gin-Tônica (R$12,00), um MacBook Air, ou seja, lá quanto custe aqueles porta-trecos de Lojas de R$1,00.
Toda doação é bem-vinda, se tiver interesse, há dois métodos:
1 – faça via PagSeguro, é só acessar em seu navegador a página carloscardoso.com/livros
2 – via Paypal, envie qualquer quantia em qualquer moeda para cardoso@pobox.com
Lembre-se, nenhuma doação é obrigatória, e se fosse você eu nem doaria nada pra um autor tão preguiçoso que aproveitou este texto da sacolinha do livro anterior. O importante é que você se divirta.
Pré-Fácil
Durante um tempo frequentei uma comunidade de jovens candidatos a escritores promissores do Facebook. Foi um período extremamente divertido e extremamente frustrante. Vi centenas de jovens que nunca haviam lido um livro na vida se esforçando em produzir material medíocre. Dá pra escolher, há os que querem copiar Crepúsculo, os que querem fazer seus próprios Jogos Vorazes, os que acham que mestrar RPG qualifica para escrever ficção.
O trabalho dos floquinhos, que nunca falavam em escrever um livro, mas no mínimo uma trilogia, pode ser bem definido pela alfinetada de Samuel Johnson:
“A sua obra é boa e original, mas as partes que são originais não são boas e as partes boas não são originais”.
Pois bem! Se eles são capazes de (tentar) produzir histórias horríveis, eu também sou. Este livro é a prova disso. Me desafiei a escrever uma história de ficção para Jovens Adultos com todos os clichês possíveis e imagináveis, kibando descaradamente referências de cultura pop. Sem dó.
Minha história não tem o menor respeito por cronologia, História ou fatos. Misturo temas e personagens sem a menor preocupação. Só nas horas que tento parecer erudito, demonstrando conhecimento específico no melhor estilo Dan Brown, fiz alguma pesquisa –cof cof wikipedia-. Na maior parte do tempo o que não é chutado é inventado, e todas as referências culturais brasileiras se resumem a meu conhecimento de folclore de 4ª série.
Mesmo assim essa bagaça está divertida, divertida de escrever e divertida de reler.
Meu objetivo era fazer um livro ruim, e isso eu acho que consegui. Ruim, mas não chato, mas isso depende de você. Se encarar como uma história séria, vai pedir seu dinheiro de volta. Se entender como um Sharknado, como um Ataque dos Tomates Assassinos, como um Spaceballs, aí irá gostar.
Está dada a dica. Sente-se, fique confortável e lembre-se: Deste ponto em diante curiosidade mórbida funciona muito melhor do que interesse literário.
Prólogo
Muito tempo atrás, em um reino muito, muito distante (se você não estiver no Brasil)
O reino vivia um dia normal, no Ano do Senhor de 1673. Na pequena vila de Tarituba, entre Rio de Janeiro e São Paulo, os pássaros cantavam quase acompanhando o ritmo das marteladas de Oswaldo Blacksmithson, o ferreiro local. “Outro dia outra carruagem consertada”, pensava ele enquanto brandia seu martelo inclemente, forjando o rubro metal e dobrando-o à sua vontade.
Entre os vendedores, transeuntes, menestréis e donas de casa comprando ingredientes para o almoço daquele dia, o prefeito Manoel Taylor passeava gordo e sorridente. Reeleito pela segunda vez, com promessas de melhorar saúde e educação, ele podia agora descansar da longa campanha. Os debates foram exaustivos, e a proposta de seu adversário, de construir uma universidade em Tarituba era bem razoável.
“Bom dia, excelência! ” – Disse Marialva, a popular vendedora de flores. “Tome, um cravo para sua lapela, cortesia da casa”
“Obrigado, milady” agradeceu ele, fazendo uma mesura exagerada.
“CRAAAA! ” “CRAAAAA! ”
Os mais atentos estranharam. Ainda era cedo, o Tucano do Meio-Dia não deveria chegar senão em algumas horas. Uma ave-mensageira àquela hora sempre trazia notícias muito boas ou muito ruins.
“Vejamos o que o Destino nos reserva” pensou Manoel Taylor, erguendo o braço oferecendo à ave treinada um convidativo poleiro/pista de pouso.
Fruto de uma longa linhagem de aves-mensageiras, os tucanos foram criados por gerações por sua docilidade, inteligência, capacidade de voar longas distâncias e por conseguirem carregar em seus bicos rolos de pergaminho. Foi um rolo desses que o prefeito recolheu da ave, soltando-a em seguida para que ela voasse até o posto local de correios, onde seria alimentada e descansaria até sua próxima missão.
“Prove, Prefeito, seus favoritos”
Manoel sentiu o chão sumir debaixo de seus pés. A voz de Michelle, a vendedora de cookies amanteigados costumava desencadear reações pavlovianas no Prefeito, mas naquele momento a irresistível oferta de seu petisco favorito era um som agudo quase imperceptível na mente do político.
O texto do pergaminho dizia:
“Rio de Janeiro, 14 de setembro de 1673
DE: Secretaria Imperial de Defesa
PARA: Todas as Autoridades
Na manhã deste sábado nossas tropas foram atacadas em várias frentes. Há relatos de confrontos em diversas regiões do país, aparentemente iniciado em Natal, na região da Barreira do inferno, o desembarque dos invasores seguiu e ocupou Fortaleza e Teresina, mas também controlam João Pessoa e Recife.
Relatos iniciais de que se tratavam de tropas francesas ou holandesas estavam errados. Os invasores utilizam estranhas máquinas, algumas são carruagens sem cavalos, outras parecem pratos invertidos, voando provavelmente por obra de poderes malignos.
Nossos mosquetes são inúteis. Canhões conseguem deter tropas individuais, mas não seus veículos. Estamos sendo dizimados. O Imperador Pedro I já foi movido para uma localização secreta.
Há consenso que os inimigos pretendem ocupar todo o Reino. Ninguém está a salvo. Protejam-se, fujam. Salvem os seus, escondam-se. Organizem guerrilhas, junte as tropas locais. Resistir é preciso.
Tentaremos manter as linhas de comunicação abertas o maior tempo possível.
Ass:
José Bonifácio – Secretário de Segurança Nacional Imperial”
O prefeito era um homem de mente aberta, progressista, mas a idéia de uma invasão do Reino era difícil de acreditar. Se não fosse o selo oficial do Império ele desconsideraria a mensagem como alguma brincadeira.
“Prefeito? ”
Manoel percebeu a insistente vendedora. Pegando a cesta inteira, comandou “Bote na minha conta” e marchou para a Prefeitura, planejando os próximos passos. Se iria enfrentar a morte certa e o Fim dos Tempos, ao menos a reunião onde discutiria isso com seu gabinete seria bem-servida de cookies amanteigados.
Capítulo I
Chosen One
John Chosen era um adolescente como qualquer outro. Com 15 anos dividia seu tempo entre ajudar na empresa da família, as aulas no Grupo Educacional Galileu Galilei, os jogos de ludopédio de botão com seu avô e os ensaios de seu grupo de música, onde tocava alaúde, para delírio das meninas locais.
Norman e Stephanny Chosen eram um casal de 40 anos donos de uma estalagem na aprazível vila de Tarituba, que acolhia viajantes entre Rio e São Paulo. Com eles vivia seu filho mais novo, John. Suas duas irmãs, Nathally e Sverina Chosen, gêmeas com 22 anos, estudavam arquitetura em uma renomada faculdade em São Paulo.
A música era a forma com que John gostava de se expressar. Era comum passar horas trancado no quarto estudando partituras e tocando seu alaúde, aprendendo os hits das bandas locais e até das estrangeiras. “She loves You Ye Ye Ye” era uma de suas canções de amor inglesas favoritas.
Naquele dia John dedilhava preguiçoso os acordes de uma música que estava compondo para o baile de verão de sua escola. Era uma manhã de sábado, os hóspedes já haviam tomado café e saído para passear na cidade ou passar o dia na praia. O pai de John trabalhava no barco que construía no porão da casa, sua mãe discutia com a cozinheira a melhor forma de assar um cupcake e tudo parecia bem, até que o silêncio foi interrompido por um barulho de freio. Uma carruagem havia parado bruscamente na frente da estalagem. O som foi seguido de passos apressados.
“Norman, Norman, onde está você, homem? ”
Renato Malhado, melhor amigo de Norman e jornalista editor do Correio da Serra, o maior (e único) jornal da cidade mal conseguia respirar. Em suas mãos, mãos recortes de jornais de outras cidades.
Norman subiu correndo do porão. Stephanny e Palmira, a cozinheira, chegaram na sala ao mesmo tempo. John já estava lá. Da última vez que Renato havia ficado tão exaltado foi quando anunciou a queda da Bastilha, mas isso havia sido anos atrás.
“Meus amigos, estamos sob grande ameaça, muito maior do que as Invasões Piratas”
A simples menção a piratas causou um frio na espinha de todo mundo. Próxima a Paraty, Tarituba havia sofrido bastante nas mãos daqueles bandidos. Por anos eles saquearam as costas brasileiras, até que o Imperador contratou uma força de misteriosos soldados orientais, silenciosos e mortais em seus uniformes negros. A ameaça pirata foi exterminada. Sua lembrança não.
Qualquer ameaça mais perigosa que o Barba Negra merecia a atenção de John Chosen. O alaúde esquecido no sofá, a atenção toda no homem alto e bem-apessoado, com óculos de aros finos e elegantes.
“Calma, Renato. Quer um pouco de água com açúcar? ” Indagou Stephanny, sempre preocupada. Palmira por sua vez, prestativa como ninguém se dirigiu à cozinha para preparar a mistura calmante, antes mesmo que fosse solicitada a fazê-lo.
“Não precisa” disse Renato ao mesmo tempo em que elevava a voz para que Palmira a ouvisse. “Um pouco de água pura está bom. Duas pedras de gelo e só. Obrigado, Palmira! ”
Palmira era uma negra de beiços grandes com seus 30 anos, excelente cozinheira e responsável por tudo que os hóspedes e familiares da Pousada dos Anjos comiam, a não ser quando Stephanny cismava de inventar receitas, coisa que fazia no meio da noite. “Um dia ainda supero o bolinho de polvilho daquela Palmira danada”.
Alguns a chamavam de medrosa, mas Palmira era acima de tudo inteligente. Anotava mentalmente tudo que Renato dizia. Mais tarde conversaria com Esaú, seu marido, e decidiriam se era hora de sair do caminho da História.
Renato se recostou no balcão da recepção, o dedo girando o gelo dentro do copo. A luz do Sol era decomposta em diversos arco-íris ao passar pelas pedras, mas a beleza do fenômeno não era percebida por ninguém. Juntando forças o jornalista começou a explicar o motivo de sua visita.
Contou sobre a invasão, como dias atrás o Prefeito havia recebido um comunicado do Rio de Janeiro e mantido tudo em segredo, até que jornais de fora perceberam a conspiração de silêncio. A situação era muito pior do que imaginavam. Os invasores haviam dizimado algumas cidades, deixado outras intocadas.
Relatos falavam que pessoas eram sequestradas, levadas para os veículos voadores grandes e mais tarde libertadas. Havia relatos de torturas horríveis, mas ninguém entrava em detalhes. Nem mesmo os animais eram poupados, diversas vacas haviam sido encontradas com estranhas perfurações e órgãos removidos.
Mostrando uma manchete do Diário de Itabuna, Renato explicou que semanas antes do ataque misteriosos círculos haviam aparecido nas plantações. Todo mundo achou que era obra de algum brincalhão, mas todas as cidades com as marcas foram atacadas.
“Agora adivinhem onde apareceu um círculo desses, ontem? ”
Renato ergueu uma folha de papel com uma ilustração do Morro do Divino, na periferia da cidade. Menos familiar eram as marcas que ocupavam seu topo. Estranhos círculos, linhas e intercessões. Não se parecia com nada que alguém ali tivesse visto. Nem mesmo Norman, com sua biblioteca de milhares de livros reconhecia naquelas marcas uma linguagem usada por um povo da Terra.
“O que isso quer dizer, Renato? ”
“Quer dizer, Stephanny, que Tarituba é o próximo local a ser atacado. Por algum motivo as forças inimigas se espalharam. Recebi um tucano avisando de um ataque em Guarapuava, que destruiu o Castelo Vermelho, parece que não sobrou ninguém, e olha que eram o maior clã daquela região do Paraná. ”
John não se conteve e entrou na conversa:
“Podem estar testando nossas forças. Aprendi na escola que os ingleses e franceses fizeram muito isso na Guerra dos Cem Anos”
“Verdade, pequeno John, verdade. Mas e nós? Qual será o interesse dessa gente em atacar Tarituba? ”
“Não importa” disse Norman “Temos que fugir. Por tudo que você falou o melhor é nos refugiarmos. Em alguns dias fechamos a pousada e saímos. Meu primo tem uma fazenda a uns 100Km de Palmas, duvido que alguém pense em invadir o Tocantins. ”
“Mas pai, temos que lutar, defender nossa terra, todo mundo sabe disso”
“Você não sabe nada, John Chosen. Nosso primeiro dever é proteger nossas famílias. Os soldados do Imperador que ganham para se arriscar. ”
Um dia quando fosse velho e sábio John entenderia, mas naquele momento o pai soava estranhamente covarde. Morte e Guerra eram conceitos difíceis para um adolescente de classe média em uma família brasileira bem-ajustada de 1673. John iria aprender sobre elas da forma mais difícil.
“Enfim” concluiu Renato “Vocês são meus amigos mais queridos. A minha pesquisa mostrou que entre as marcas e o ataque o período varia de 8 a não mais que 30 dias. Vocês devem se preparar para fugir o mais rápido possível. Na edição de amanhã do Correio publicarei a história toda. Sei que vai causar pânico, mas é a melhor forma de proteger a população”
Capítulo II
Paz & Guerra
No recreio do Grupo Educacional Galileu Galilei não se falava em outra coisa. Muitos estudantes haviam faltado aula, as famílias fugindo da cidade, mas nem por isso a freira que dirigia a escola municipal havia cancelado o período letivo.
Durante o domingo mais pássaros trouxeram novas notícias. Viajantes vindos do Rio de Janeiro confirmaram que raios do céu incendiaram várias instalações do Exército, incluindo os Dragões da Independência e o Batalhão Tonelero. As forças do Império Brasileiro estavam sendo dizimadas uma a uma.
Na mesa da cantina um grande mapa do Brasil era mantido aberto por quatro copos nos cantos. Peças de chumbo de um jogo de tabuleiro devidamente confiscado de alunos da 4ª série representavam as forças brasileiras e inimigas. John levava a sério sua posição de general de mentira.
“Ë isso que sabemos então. Fora as forças principais no Nordeste, que parecem estar diminuindo a velocidade, começaram a acontecer ataques em diversas regiões, mas por quê? ”
O grupo de meninos e meninas olhava par ao mapa, tentando encontrar um padrão. Dezenas de cidades atacadas, mas parecia aleatório.
“EUREKA!” Grita Ping, um menino chinês de 14 anos, filho do dono da loja de quinquilharias da cidade. “Tive uma humilde idéia, John-san!”
Há muito John aprendeu a respeitar o amigo oriental. Ping não havia ainda desenvolvido a sabedoria tão associada a seu povo, mas já demonstrava uma Inteligência ímpar, tão reconhecida por todos que ninguém achou que ele estava se exibindo ao gritar eureka, palavra que a professora de ciências ensinara umas duas semanas atrás, quando aprenderam sobre Arquimedes.
“Vamos tentar visualizar os ataques não só no espaço, mas no tempo. Cada um pega uma lista de cidades que foram atacadas em um determinado dia. Quando John comandar, colocamos as peças no mapa de acordo com a ordem em que cada ataque aconteceu”
“Com assim, Ping?”
Bebel Johan era a menina mais querida do grupo, especialmente por Ping, que arrastaria uma caravela por ela. Com lindos olhos verdes e madeixas louras levemente enroladas caindo até a cintura, ela havia sido eleita Rainha da Primavera 3 anos seguidos. Infelizmente só via Ping como amigo, mas isso não o impedia de sonhar.
“Apenas faça, minha linda flor de lótus. Todo mundo vai entender”
Bebel não resistia a um elogio. Pegou a folha restante, consultou as datas e ficou esperando John, que já havia entendido, começar a dar ordens.
Subindo no banco ele pôde observar o mapa de cima pra baixo.
“OK, dia 1, na ordem”
Allain Roberto, o mais velho do grupo e filho do padeiro mais popular da região posicionou as peças. Pequenos soldados de chumbo marcaram Natal e várias cidades próximas.
“Dia 2, avançar”
Foi a vez de Dominica Santinni, uma morena de cabelos longos e lisos, 13 anos e muito magra. Com agilidade seus dedos longos e finos pousavam cavalos e torres (as peças do grupo de xadrez na mesa ao lado forma confiscadas também). Mais cidades foram atacadas, mas algo acontecia de diferente. Lugares distantes sofriam um ou outro ataque, com um foco aparente no Sudeste.
“Dia 3, agora”
Bebel posicionou a primeira peça no Acre, mas todas as seguintes foram em cidades de Rio e São Paulo, com alguma concentração na capital fluminense, mas quase todas em uma área entre Varginha, Poços de Caldas e Juiz de Fora.
“Ping, está vendo o que estou vendo? ”
“Estou sim, meu honorável amigo. E mais. Se me permite uma sugestão…”
“Faz favor”
“Vamos reorganizar. Cada um recolha suas peças, escolham ataques do dia 3 e sigam as ordens de John”
O grupo fez como pedido. Agora era claro que as cidades haviam sido atacadas em sequência, formando um semicírculo em torno de Tarituba, mas por algum motivo paravam quando chegavam a 100Km da cidade.
“Agora de trás pra frente, voltem no tempo”
Era inegável, os invasores haviam atacado aleatoriamente várias localidades, depois começaram a enfraquecer e isolar tudo em volta de Tarituba, sem tocar na cidade.
“Precisamos avisar o Prefeito! ” – Disse John, esquecendo que em alguns dias ele e seus pais iriam fugir para Palmas.
O resto da manhã passou voando. Os professores não estavam focados na aula, muito menos os alunos. Andrei, um imigrante russo que dava aulas de química por profissão e aterrorizava alunos por hobby sequer fizera as costumeiras ameaças de borrifar os alunos com Monóxido de Dihidrogênio, seja lá o que for isso.
“Que beleza, ele esqueceu o dever de casa” sussurrou John, olhando o relógio na parede e percebendo que só faltavam uns 5 minutos para o final da aula. Normalmente Andrei passava uns 15 minutos explicando em detalhes a tarefa impossível para o dia seguinte.
“Nem acredito. Ele está ficando velho, só pode” respondeu Bebel.
“Professor, o senhor esqueceu de passa-“
Antes que Ping –sempre ele- terminasse a frase Allain chutou a cadeira do jovem oriental, que só não caiu por ter anos de treino em Tai Chi.
Testemunhando tudo e não preocupado com alunos se matando, ou como ele chamava nas reuniões pedagógicas “perdas aceitáveis”, Andrei estilhaçou a esperança de todos para uma noite sem cara enfiada nos livros.
“Não esqueci de nada, Ping. É que como o mundo está acabando, não acho justo que EU perca muito tempo com o dever que vocês vão fazer. Então deixemos tudo simples: Para amanhã, quero 10 páginas de pergaminho explicando a nova Teoria do Flogístico”.
Capítulo IV
Prefeito Afortunado
Depois do choque inicial quando a notícia da invasão apareceu nos jornais o Prefeito de Tarituba rapidamente usou de sua sagacidade de velha raposa política para fazer o que políticos fazem melhor: Não fazer nada dando impressão de que estão fazendo alguma coisa. Em defesa dele, com ataques aparentemente aleatórios por todo o país, sair de um lugar para outro não fazia diferença, e agora aqueles garotos insistentes parecem estar mostrando que ele tomou a decisão certa afinal.
“Então nós não seremos atacados? ”
“Não é isso, Prefeito. Nós não fomos atacados, é diferente”
O entusiasmo de John dera lugar ao desânimo. Conversar com adultos quase sempre tinha esse efeito, mas não tão rápido. Ali, entretanto todos pareciam se concentrar em derrubar suas idéias, idéias essas que, se confrontado ele mesmo não saberia dizer quais eram.
“Eu não vejo esses ataques como nada mais do que aleatórios” – disse Samantha Power-Souza, Secretária de Segurança Pública.
Loura, séria, com profundos olhos azuis e cabelos bem curtos Samantha era uma lenda na comunidade de segurança. Começou sua carreira como escrivã, subindo na hierarquia chegando a comandar as forças policiais de todo o Condado. Dizem que ela havia lutado até em Canudos, mas ninguém tinha coragem de perguntar.
Aposentada depois de uma vida de serviço, Samantha havia assumido o cargo em Tarituba mais como um favor ao Prefeito, amigo de longa data, mas principalmente por causa dos cookies amanteigados das reuniões de gabinete, eram deliciosos.
“Também não vi nenhum padrão” concordou o Secretário de Transportes, seguido de outros que se apressaram em desprezar a decisão do Prefeito em perder tempo com aqueles garotos.
A reunião havia se tornado uma confusão só. Ping, alheio a tudo rabiscava furiosamente em seu bloquinho de anotações. John achou melhor não interromper, deixando o amigo trabalhar, os adultos discutirem e os outros do grupo sem nada entender, até que um aceno do jovem oriental indicou que era hora de pedir atenção.
“GENTE! ” Gritou John Chosen, dando um tapa na mesa.
As atenções se voltaram para ele, que com um gesto da cabeça indicou Ping.
“Senhor Prefeito, Senhora Secretária, peço humildemente que vejam meus desenhos. Eu fiz em meu bloco um monte de cópias do mapa da região, em cada uma das folhas desenhei uma cidade atacada, em ordem cronológica”
“Já vimos mapas, meu caro jovem”
“Mas não assim, Dona Samantha. Veja quando eu seguro o bloco pela borda e vou soltando as folhas…”
A luz do candelabro iluminou o pequeno bloco. À medida em que Ping soltava as folhas, as imagens ganhavam movimento, como que por mágica. O antes inescrutável padrão era evidente aos olhos mesmo dos mais céticos.
“Certo então, e agora? ”
“Agora, meu caro Prefeito, é mandar um Tucano pro Rio de Janeiro com essa informação. Não há nada que possamos fazer além disso”
Samantha sempre pensava em termos estratégicos, no Quadro Maior. Se a cidade havia sido poupada havia um motivo. Não deveriam ficar gratos, mas aproveitar essa chance.
Capitulo V
Visitantes
Tudo aconteceu muito rápido. Dois centuriões da Guarda Municipal de Tarituba faziam sua ronda quando viram uma luz se mover no céu. Não era um cometa, e mesmo que fosse não havia mais más-notícias para ele trazer. Não era uma estrela cadente, mas um ponto que piscava em várias cores e diminuía de velocidade. Quando os guardas alcançaram a pequena chácara no fim da rua, o ponto havia se tornado um objeto estranho, pousando com grande barulho e levantando uma nuvem de poeira.
Não maior que uma carruagem, o objeto era alto, pintado de azul com painéis de vidro. Luzes percorriam sua superfície, em padrões desconhecidos. Agora parado não fazia nenhum som, exceto o sibilar da porta que se abria. O que saiu de lá fez o sangue dos centuriões gelar.
“É um demônio! ”
“Só pode! ”
Quando o visitante saiu da frente os centuriões puderam ver algo muito estranho. Era como se o objeto fosse maior por dentro do que por fora. Antes que tivessem certeza a porta se fechou atrás da criatura cinza.
Aparentemente nu, o ser era muito magro, humanoide, mas sem nenhum pelo no corpo, nem órgãos genitais.
“Veja, Johan, ele não tem vergonhas” cutucou Alfredo, que não sabia a hora de deixar de ser inconveniente.
O visitante tinha olhos grandes, muito grandes, negros e sem pupilas, sua cabeça oval era desproporcional para padrões humanos. Nas mãos trazia um objeto que emitia luzes e sons, objeto que apontava para tudo a sua volta.
Chamando a atenção do visitante um cachorro vira-lata chegou latindo e rosnando. Apontando o objeto para o animal, o visitante parou por um momento e seguiu adiante. Confuso o cachorro ameaçou uma perseguição, mas desistiu.
Percebendo os dois centuriões o visitante começou a andar em direção a eles. Na tela do objeto um borrão. Se um humano tivesse a capacidade cerebral do visitante veria gráficos esquemáticos detalhando a fisiologia dos centuriões, a letalidade de suas armas e seus pontos fracos.
“Fique aqui”
Johan Syfos sempre levou seu trabalho a sério. Mesmo que hoje em dia a segurança municipal de Tarituba se resumisse a separar brigas de bêbados na taberna local, auxiliar turistas perdidos e desvendar a eventual carruagem arrombada para roubo de caixa de música, uma vez centurião sempre centurião. Ele havia feito um juramento para cuidar e proteger a cidade e seus habitantes.
Caminhando decidido em direção ao visitante, Johan achou melhor uma abordagem pacífica. Com o mosquete nas costas, manteve uma displicente mão no coldre da garrucha, pronto para sacá-la se necessário.
“Ei você aí, cidadão” chamou Johan, sem muita convicção da cidadania do visitante, mas procedimentos são procedimentos.
“Parado, deixe-me ver sua Carta de Trânsito”.
O visitante, fisicamente impedido de continuar pelo centurião à sua frente olhou, curioso. Sua boca muito pequena não emitiu nenhum som, mas ele fez o universal movimento de lado com a cabeça, que todo dono de cachorro reconhece como “Não estou entendendo”.
“Eu disse: Documentos, e não me aponte esse instrumento! ”
Agora muito próximo o sensor tinha resolução submicroscópica. O Explorador entendeu que seria um bom momento para colher dados daquele humano em especial, e fez exatamente o que havia sido comandado para não fazer.
Assustado Johan sacou da garrucha, engatilhou e a apontou para o visitante. “Mãos ao alto! Largue sua arma! ”
Não havia sido previsto contato com locais naquela missão, então o Explorador também não havia sido equipado com um Módulo Babel. Não que importasse, ninguém ligava muito para o que os humanos falavam. Exceto que os instrumentos mostravam que o objeto na mão do humano era uma arma com potencial letal não-nulo. Pequeno, mas real, e isso era inadmissível.
Os olhos do visitante se fixaram em Johan. Mais rápido que um pensamento máquinas há muito implantadas em seu corpo, maravilhas tecnológicas indistinguíveis de mágica acionaram defesas internas que comprimiram o volume de ar equivalente a uma piscina olímpica em um volume ínfimo, mais pressão que o mais profundo dos oceanos.
Executando a vontade do visitante sua tecnologia inimaginável teleportou aquele volume de ar para o centro da cabeça de Johan. Por uma fração de segundo ele nada sentiu, até que o campo de força que mantinha o ar comprimido deixou de existir. Momentos depois, Johan seguia o mesmo caminho.
Gritando horrorizado ao ver o corpo do amigo cair ao chão, sua cabeça explodida como uma abóbora cheia de fogos de artifício, Alfredo não percebeu algo que poderia ter salvo sua vida: A rua estava pintada de sangue, mas o visitante permanecia imaculado.
Apontando seu mosquete, Alfredo preparou-se para um tiro certeiro. Meros 30 metros o separavam do alvo. Armando a pederneira, ele puxou o gatilho. A bala seguiu, implacável, mas ao invés de matar o assassino de seu amigo, ela atingiu uma parede invisível alguns centímetros em volta do visitante.
Em um tom esverdeado uma luz translúcida delineou por alguns instantes o que o vocabulário de Alfredo desconhecia se chamar campo de força. Sem demonstrar raiva, ódio ou mesmo tédio, o visitante olhou para o centurião sobrevivente, que sentindo uma súbita dor lancinante em sua cabeça, percebeu que seu destino estava selado, tal qual o de seu colega.
Capítulo VI
Consequências
Durante o dia seguinte vários incidentes semelhantes se repetiram, mas em todas as vezes os visitantes (ou o visitante, ninguém sabia se era mais de um) apenas observavam. Ninguém mais foi morto, exceto um pobre cocheiro que fez uma curva brusca, sem olhar e só não atropelou o visitante por este ter explodido a carroça, o cavalo e o condutor.
Aparentemente o visitante queria examinar um a um os habitantes. Se ninguém o impedisse ele nada fazia, mas quando pessoas se trancavam em casa ele usava seus poderes para desintegrar a parede e então entrar.
“Padre, eles são demônios, isso é um portal para o Inferno? ”
A pequena multidão em volta do objeto que trouxera o visitante não se atrevia a chegar muito perto. Um raio de luz cegante havia destruído o ancinho e a mão de um dos aldeões que tentou cutucar a estranha máquina.
O Irmão Claudius Thomas era o padre da cidade. Jesuíta de formação e vocação, trazia na alma a paixão por conhecimento e exploração que tornou famosa sua Ordem e tantos de seus membros cientistas
Ele nunca pensou realmente o motivo que fez Deus decidir que ele nasceria um anão. Alguns dizem que baixinhos compensam sua deficiência vertical com ego, mas não era o caso do Padre Claudius. Claro, questionar propósito divino, mesmo que em voz baixa era meio que norma entre Jesuítas com formação científica, mas o fato de ser anão trazia tantas vantagens que Claudius não achava razão para questionar Deus sobre isso. Talvez no futuro, quando estivessem cara-a-cara.
“Não creio que sejam demônios. Decerto o estranho não é bem-intencionado, mas ele não se parece com nenhuma descrição que eu tenha lido. Consultei até o Codex Gigas, vulgarmente conhecida como Bíblia do Diabo, e nada se encaixa”
Observando os rastros no chão, o Padre apontou:
“Vejam: Ele tem 3 dedos e uma planta do pé lisa, nada de cascos. Também não há chifres nem cheiro de Enxofre”
“Mas padre” – questionou um dos aldeões – “Essa coisa não é de Deus! ”
“Isso é fácil de descobrir. Você aí, me traga um copo de água. ”
Claudius pensou em pedir sal também, mas além de não ser obrigatório a parte do exorcismo sempre assustava os fiéis, então segurando o copo de água pura, proferiu o antigo ritual de consagração:
“Deus, qui ad salutem humani generis maxima quæque sacramenta in aquarum substantia condidisti: adesto propitius invocationibus nostris, et elemento huic, multimodis purificationibus præparato…”
A multidão olhava com interesse crescente. A voz profunda contrastava com o tamanho diminuto do sacerdote, que naquele momento parecia ter poder de comandar Lúcifer em pessoa.
“aspersione hujus aquæ effugiat: ut salubritas, per invocationem sancti tui nominis expetita, ab omnibus sit impugnationibus defensa. Per Dominum, amen”
“Pronto. Um copo de água benta, legítima. Agora, o primeiro teste. ”
Erguendo o copo o Padre Claudius exibiu para a máquina seu conteúdo. Aparentemente nada aconteceu, mas internamente sensores e tecnologias além do conhecimento de qualquer Homem analisavam milhares de parâmetros. Mais poder de computação do que toda a Internet do Século XXI reunida era usado para determinar que fora impurezas insignificantes e alguma vida microscópica, o que havia ali era apenas água.
“Aparentemente” disse o Padre em tom didático “ela não sabe ou não tem medo do que é água benta. Vejamos se contato direto funciona”.
Molhando os dedos o Padre aspergiu algumas gotas de água benta na parede na máquina, que nada vez. As gotículas deslizavam sem resistência e se acumulavam na moldura de um dos painéis.
“Também nada. Talvez uma aproximação mais direta”
“Padre, cuidado! ”
Molhando a ponta do dedo na água benta, Claudius encostou o dedo no vidro, sem fazer pressão. Delicadamente desenhou uma cruz, enquanto recitava um dos inúmeros rituais de exorcismo.
“Exorcizamus te, omnis immundus spiritus omnis satanica potestas, omnis incursio…”
Em verdade ele não esperava reação. Anos de experiência o ensinaram a diferenciar entre obras do Diabo e obras de Homens, e a temer muito mais pelas segundas. Não que ali parecesse algo feito por seus semelhantes, mas se os propósitos eram diabólicos, a tecnologia em si era muito mais mundana.
Claudius permaneceu em silêncio pensando no próximo passo, quando a multidão começou a gritar e debandar para todos os lados.
O motivo era o visitante, caminhando rumo à sua máquina.
“Diabos, que custa? ” Pensou o Padre, tão inundado de curiosidade científica que nem percebeu que estava blasfemando.
Se aproximando do visitante, Claudius era tudo menos ameaçador. Com 1m35cm, era menor que seu antagonista, que mal chegava a 1m50cm. Desacostumado com um humano como aquele, o visitante retribuiu a curiosidade, estendendo seu instrumento de medição.
Claudius abriu os braços, o visitante entendeu o convite e o sondou, seu encostar. Por um momento o padre se sentiu na loja de Joaquim Taylor, alfaiate da cidade, mas com bem menos alfinetadas ocasionais.
“Agora é minha vez. Primeiro, vamos ver se você realmente não é uma criatura das profundezas”.
Molhando o dedo na água benta Claudius passou a substância na pele do braço, depois no rosto. Em seguida bebeu um pouco. Feito isso, estendeu o copo lentamente para o visitante, que deu um passo atrás, mas voltou e sondou o conteúdo daquele objeto.
“A curiosidade matou o gato. Matará o demônio? ”
Para surpresa de Claudius o visitante esticou a mão e mergulhou seus dedos compridos e sem unhas no copo. Levando-os até a pequena boca, provou da água.
“Certo. Hipótese mais popular, invalidada. Vamos testar a minha teoria”
Desenhando no chão de barro batido Claudius fez uma linha reta, vários pontos acima dela e em seguida apontou para si, indicando a linha reta, e para o visitante, indicando os pontos.
“Nada”
O visitante olhou o desenho e o gestual, mas nada vez. Não indicou reconhecimento. Claudius sabia que o tempo estava acabando, quando lembrou: estava repetindo idéias populares e erradas. Erastóstenes, Copérnico, Colombo e tantos outros haviam deduzido a real forma da Terra.
Apagando o desenho Claudius fez um círculo, com um círculo menores em volta e pontos por toda a volta. Repetiu os gestos. O visitante dessa vez mostrou compreensão. Apontou para Claudius, em seguida para o círculo maior, mas ao invés do ponto utilizado pelo padre, indicou a si mesmo e o ponto do meio de três pontos que Claudius havia desenhado meio sem pensar que eram muito semelhantes à constelação de Orion.
“Fascinante”
Erguendo-se o visitante deu por encerrado seu Primeiro Contato. Entrando rapidamente no objeto, fez um gesto para que Claudius se afastasse, sugestão prudentemente acatada.
Um ruído ensurdecedor tomou conta da rua. Uma nuvem de luz e poeira encobriu o objeto momentaneamente, até que ele a ultrapassou e subiu no céu do finzinho da tarde, até desaparecer entre as nascentes estrelas.
“Não sei quem você é, meu amigo” pensou o Padre, “Mas o Profeta Elias tinha muito mais classe”.
Capítulo VII
Imperius Rex
Os dias se passavam e a situação era cada vez pior. Informes dos países vizinhos mostravam que apenas o Império Brasileiro havia sido atacado, mas ninguém ousava interferir. Para agravar a situação quando o Palácio do Itamaraty, sede das instituições diplomáticas do país pensou em pedir ajuda a nossos aliados, descobriram que a encomenda de aves-mensageiras de grandes distâncias havia sido trocada.
Ao invés de andorinhas europeias, o fornecedor havia enviado centenas de andorinhas africanas, que como todos sabem não são migratórias. O Império estava isolado do resto do mundo.
Na Sala de Guerra do Palácio Imperial a notícia não foi nada bem-vinda, mas ao menos os ataques haviam cessado. As máquinas voadoras dos invasores sobrevoavam as cidades e eliminavam qualquer concentração de tropas brasileiras, mas as forças de terra apenas aguardavam. O QUÊ, ninguém sabia.
“Qual a explicação para isso? ” Irritado o Duque de Caxias brandia seu bastão de comando, usado de forma nada cerimoniosa como apontador, batendo no Grande Quadro.
A Sala de Guerra ficava no subsolo, era acessível apenas por um profundo elevador, movido por uma roda de bois. Poucas pessoas tiveram o privilégio de pousar os olhos naquele recinto. Nenhuma delas sem a autorização explícita do Imperador.
Ao fundo o Grande Quadro, onde mapas do Brasil e das principais cidades e do mundo eram continuamente atualizados. Minúsculas lamparinas marcavam os pontos de interesse. No centro da Sala uma enorme mesa circular oca, em formato de O era o único ponto iluminado.
Repetindo a estrutura da mesa uma estrutura suspensa comportava os lampiões, fazendo um círculo completo, dando à Sala de Guerra um ar sério e sinistro. O Imperador se sentava com os consultores ao seu lado, em ordem decrescente de importância. Às vezes recebiam enviados de outras nações, mas era algo muito raro. Todos se lembram quando o Embaixador Argentino foi flagrado tentando copiar em um pergaminho o Grande Quadro.
Ele foi detido pelo então Marechal Caxias, o que resultou em uma briga, e se há algo que o Imperador não tolera são brigas na Sala de Guerra.
“Nossas unidades de reconhecimento confirmaram essas informações? ”
A pergunta do Almirante Tamandaré era pertinente. A mensagem do Prefeito de Tarituba era por demais inacreditável, mas ninguém fantasiaria algo com tantos detalhes. Ademais, os técnicos sinaleiros do Palácio seguiram as instruções detalhadas e realmente havia uma concentração de tropas inimigas cercando a pequena vila.
“Aqui, senhor! ”
Um ajudante de ordens estendeu um rolo de pergaminho com a tradicional fita vermelha de ULTRA-SECRETO. Era um relatório mais recente, ainda molhado com a baba do tucano. Abrindo o rolo e lendo, o Almirante teve a confirmação que queria.
“Segundo este relatório há realmente tropas inimigas nas regiões marcadas no mapa. Nossos homens voltaram no caminho delas, sem que fossem detectados, e acharam indícios de ataques que confirmam toda a informação. Há algo acontecendo ou para acontecer em Tarituba. ”
O bastão de comando atingiu o quadro com tanta força que duas lamparinas caíram, espalhando óleo no chão. Indiferente ao pequeno incêndio, rapidamente apagado pelos auxiliares, o Duque de Caxias repetiu, energicamente:
“Alguém. Me explique. Isso. ”
Poucas pessoas ousavam levantar a voz assim na presença do Imperador. Seu maior General era uma delas.
“Não há explicação, não há nada de estratégico em Tarituba. Eu coloquei toda a Inteligência da Marinha para tentar achar uma explicação, voltaram de mãos vazias” – disse Tamandaré.
Impávido e silencioso, o Imperador Pedro I assistia seus consultores de confiança. Era importante deixar que especialistas exercessem seus talentos, mas algumas vezes eles não viam o cenário todo.
Educado pelos mais conceituados sábios que o dinheiro da Corte pôde contratar, que o explicaram todas as coisas sobre o céu, a terra, a água e o ar, Dom Pedro ainda contava com conhecimentos ocultos. Ao atingir o 5º Dan da Maçonaria foi presenteado por José Bonifácio com obras originais de Galileu, Leonardo Da Vinci e Arquimedes, além de um cartão com um endereço e uma frase secreta, com os quais poderia solicitar qualquer volume da Biblioteca Secreta de Alexandria.
Erguendo a mão o Monarca comandou silêncio. As atenções se voltaram a ele, que com voz tranquila pediu:
“Uma carta estelar do dia 14 de setembro. ”
Generais e Ministros olharam para Assistentes que olharam para Assistentes de Assistentes e em uma corrente silenciosa a ordem foi passada. Logo o representante do Observatório Nacional, no extremo oposto da mesa levantou e correu até o Imperador, com um grande rolo de papel.
“Aqui, Majestade! ”
Normalmente o protocolo manda que não se faça nada antes do Imperador comandar, mas o jovem astrônomo sabia que estava diante de um colega cientista. As escapadas do Monarca eram famosas, mas as realmente secretas, para o Observatório Nacional na Quinta da Boa Vista não eram divulgadas.
Abrindo a carta celeste na frente do Soberano o astrônomo deu por finda sua tarefa e ficou esperando os questionamentos. Mal sabia ele que estava diante de um estudioso dos céus que havia sido treinado por Tycho Brae em pessoa.
“Vejamos” – disse o Imperador, a ninguém em especial – “Nenhum eclipse, nenhum ocultamento, ninguém em perigeu. ”
Puxando uma pena e um bloco de pergaminho o Imperador começou a fazer contas, envolvendo radianos, ascensão reta, ᵠ, Δ, ᵩ, Σ, Θ e outros símbolos. Esticando o olho o representante do Observatório percebeu o que Dom Pedro fazia: Calculava padrões estelares para vários locais, como a Barreira do Inferno, Rio, Tarituba e o centro geográfico do Brasil, em Palmas.
“Droga! Pense, Pedro, Pense! ”
Ninguém ousava interromper o Imperador, por mais que todos tivessem certeza de que enfrentavam uma ameaça real. A culpa era dos invasores, não das estrelas.
“Não funciona” – pensou Pedro – “não estou vendo a grande perspectiva. Estou preso a detalhes. ”
“Você, venha cá. Olhe para esta carta e me diga o que vê. ”
O jovem astrônomo deu alguns passos adiantei, ajeitou a cabeleira loura quase branca, respirou fundo e olhou para a carta que já vira tantas vezes nos últimos dias.
“Bem, Majestade, é um dia normal, com fenômenos comuns. Temos Saturno quase sem suas –como Galileu Chama, orelhas, o Sol está se curando das feridas, como faz a cada Onze anos, a Lua está entrando na Sétima Casa e Júpiter alinhado com Marte e…”
*Click*
Na mente do Imperador padrões antes isolados se conectaram. Ele se lembrou de uma antiga profecia. Se fosse verdade o Império corria um risco muito maior, mas também havia… esperança.
“Escute com atenção, meu caro. Eu sei que você tem muitos materiais de consulta consigo. Seu futuro depende da próxima resposta. Em seus alfarrábios você traz uma cópia do calendário Maia? ”
O jovem astrônomo sabia que não teria a cabeça cortada se desse uma resposta negativa, Dom Pedro I era um Imperador magnânimo, suas palavras significavam boas promessas, se bem que a curiosidade científica era tão grande que o fato de haver no meio dos livros que ele trouxera para a reunião uma cópia do tal calendário o alegrava mais por estar colaborando com um colega.
“Um segundo, volto já! ” – E saiu correndo para o extremo da mesa, para horror dos cortesãos indignados por ele não ter acrescentado um “Vossa Majestade” ou ter esperado o OK do Imperador.
O velho livro era cheio de ilustrações de pedras circulares. As explicações do autor, Jean-François Champollion mostravam datas e eventos desconhecidos, mas agora, comparando com as posições celestes, era evidente, ao menos para Dom Pedro e o jovem astrônomo, que estavam associados.
“Este calendário Maia traz uma profecia apocalíptica, fala da volta dos deuses, do Dia do Juízo, quando colherão os frutos do que plantaram. E esse dia chegou”
“Mas Majestade” – Interrompeu o astrônomo – “O Calendário marca o Fim dos Tempos para o longínquo ano de 2012, não agora”.
Contrariar o Imperador em vários lugares era motivo para execução imediata, mas ali era um cientista falando com outro.
“Pense no todo. ” – Explicou o monarca – “2012 menos 1673 é igual a 339. 3 vezes 3 é igual a 9. 3 + 3 é igual a 6. Nove invertido é igual a 6. Temos 666. ”
“É tão óbvio, eu sou muito incapaz” – disse o astrônomo, batendo na testa com a palma da mão.
“Pelo contrário, meu jovem. Sua visão em grande escala foi fundamental. É por Ordem Imperial que a partir deste momento você seja o Astrônomo Real, Diretor e Autoridade Máxima do Observatório Nacional, que a nobre ciência da Astronomia no Brasil esteja para sempre associada a ti. Qual seu nome, rapaz? ”
Ainda em choque o jovem tornou a ajeitar a cabeleira quase branca, acertou os óculos e disse.
“Ronaldo Rogério”.
Capítulo VIII
Interlúdio
O túnel entre o Palácio Imperial e uma certa casa em São Cristóvão era um dos segredos menos bem-guardados do Império, mas todo mundo fingia desconhecer a passagem, que naquele momento era percorrida por uma figura de capa caminhando a passos rápidos, o caminho iluminado por uma tocha em sua mão enluvada.
A tocha seguia o antigo padrão romano, Enxofre misturado com Cal. Isso a tornava impermeável. O cheiro não era agradável, mas isso não preocupava o homem. Nem mesmo as gotas inflamadas caindo a seus pés eram motivo de atenção. Sua capa esvoaçava com a velocidade de seus passos, só diminuindo ao chegar ao final do túnel. Lá encaixou a tocha em um recuo da parede, puxou do bolso uma chave de latão e abriu a porta, com o familiar ranger das engrenagens.
Subindo as escadas estreitas o homem chegou até um aparente beco-sem-saída. Na verdade, a última linha de defesa caso algum invasor descobrisse o túnel que guardava seu bem mais precioso.
Puxando de uma corda oculta, ele soou um sino. Uma vez, duas, depois três.
Do outro lado a mulher, perdida nas brumas de seu romance preferido ouviu o sino. Avalon e suas histórias foram jogadas de lado. Já sorrindo ela levantou, colocou seu robe e dirigiu-se até um busto de Shakespeare, em um pedestal perto da janela. Dobrando para trás a cabeça da estátua, revelou-se um botão vermelho, de puro rubi. Pressionado, comandou um mecanismo que deslizou a pesada estante de mogno primeiro para a frente, depois para o lado, descortinando de pé, em pose especialmente heroica Dom Pedro I, Imperador do Brasil.
“Meu amor! ” – Disse ela, em tom de surpresa mas significando saudades.
“Hoje não, minha amada Domitila. Tenho uma missão para você! ”
Capítulo IX
Business as usual
Como toda região assolada por guerras, Tarituba buscou com todas as forças uma ilusão de normalidade. Seus cidadãos tentavam levar suas vidas como antes, submetendo-se às investigações dos Visitantes. Agora mais intensas, muitas vezes envolviam coletas de sangue, tecidos e em alguns casos as pessoas eram levadas pelos visitantes, sumiam por algumas horas e se recusavam a comentar o que havia acontecido.
Nem o Padre Claudius conseguia entender o comportamento dos visitantes. Depois de seu primeiro contato nenhum outro respondeu a suas tentativas de comunicação. Ele já havia desistido quando foi chamado às pressas para a praça da cidade. Lá um dos visitantes caminhava, pela primeira vez demonstrando o que poderia ser impaciência. À sua volta 3 corpos de aldeões, terrivelmente mutilados.
Sem sangue, estavam cortados ao meio, suas partes cauterizadas. O padre imediatamente pensou em uma espada celeste, mas somente anjos as carregavam e mesmo nunca tendo visto um ele tinha certeza de que aquele visitante não era um deles.
“Padre, nos ajude! ”
Hamadd, O Truco tinha esse nome não por causa de alguém com dislexia, nem por sua origem árabe, mas por causa de seu enorme apreço pelo jogo de cartas. Sua mercearia toda Sexta-Feira se tornava o centro do carteado na cidade, para raiva das esposas e deleite dos maridos, dos garçons e do Prefeito, pois além de deixarem ele ganhar, os impostos recolhidos engordavam os cofres municipais.
Dessa vez Hamadd não se orgulhava da mão que tinha. A dita mão estava a seus pés, cortada pelo visitante.
“Não se preocupe” – disse o padre, sem muita convicção.
Caminhando em direção ao visitante Claudius ergueu as mãos no gesto universal (esperava ele) de “estou desarmado”.
“Vamos, me explique, qual seu problema? ”
O visitante carregava um objeto diferente. Cilíndrico, com diversas reentrâncias. Brandindo-o o ar se encheu com um som forte, como um besouro em vôo. Da base do objeto um raio de luz muito brilhante saiu, parando por mágica depois de mais ou menos um metro.
Apontando a estranha lâmina luminosa para Claudius o visitante gesticulou com a mão livre: “você, aqui”.
Sem opção, o Padre se aproximou. Mais calmo o visitante recolheu de alguma forma a tal lâmina, prendendo a empunhadura da espada no cinto que usava. De lá puxou um objeto quadrado, mais ou menos do tamanho de um livro. Mostrando para Claudius várias imagens apareceram. Eram… ratos.
“Hum. OK, ratos. Você está me mostrando ratos. Como posso dizer que entendi? Já sei! ”
Ajoelhando-se ele desenhou rapidamente a silhueta de um rato no chão. O visitante levou as duas mãos à testa, preocupando o padre, que não sabia que na cultura dele era o equivalente a erguer as mãos para o céu.
As imagens agora mudavam. Um grupo de ratos aparecia dentro de um cubo luminoso. Claudius pensou que era uma crítica à higiene da cidade, mas isso não fazia sentido. Nem era possível que aquela gente estivesse com problemas de pragas. A não ser que eles quisessem ratos.
“Vocês também fazem experiências com eles? Bem, melhor com eles do que conosco” – pensou o Padre Claudius sem noção de que havia errado em ambas as hipóteses.
“Espere aí” – gesticulou.
Correndo entre as bancas do mercado, Claudius pegou batatas e gravetos. Espetou rapidamente quatro pedacinhos de madeira fazendo as pernas, uma batata menor como cabeça e um último graveto como cauda. Mostrou sua construção para o visitante, apontando para as batatas, a silhueta no chão e para as imagens no estranho objeto.
O visitante pela primeira vez fez um gesto tipicamente humano, acenando a cabeça positivamente.
Claudius montou mais uns três ratos, colocou em uma cesta e fez um gesto de oferecimento, em tom simbólico. O visitante acenou de novo. Agora na tela do dispositivo uma imagem mostrava a cidade naquele momento. O Sol começou a se mover rapidamente, a noite veio, o Sol nasceu e voltou ao ponto onde estava. O dedo do visitante aponto para a imagem fixa.
“Muito bom, entendi. Você quer ratos e temos até amanhã para conseguir”
Aliviado o Padre Claudius se deu ao luxo de sorrir e relaxar.
“Temos um acordo, meu amigo” – e estendeu a mão para o visitante, que obviamente não entendeu nada mas achou por bem não arrancar o membro daquela pequena criatura tão prestativa.
“Juntem as crianças! ” – gritou o padre – “temos uma missão para elas! ”
O visitante acionou seu comunicador interno, e em sua voz normal, inaudível para ouvidos humanos deu as boas notícias: “Podem parar com o racionamento, conseguimos uma fonte de comida”.
“Nós estamos colaborando com eles, é isso? ”
“Não, John, claro que não. ” – Explicou o padre
“É questão de sobrevivência. Enquanto não formos fortes o bastante para resistir temos que fazer o possível para nos mostrarmos úteis e, principalmente, não parecermos perigosos. Quem precisa de ratos afinal? E eles foram até prestativos, conseguimos que arrancassem troncos e explodissem pedras, não? ”
Algo dentro de John Chosen dizia que mesmo assim aquilo era errado, mas não seria ele a discutir com o padre mais inteligente da cidade, mesmo que o menor. E único.
“Todos já cumpriram suas cotas? Vamos, hora de fazer a entrega! ”
Carregando cada um uma gaiola com pelo menos uns 10 ratos, os jovens do grupo de John se encaminharam para a praça central, onde outra daquelas estranhas máquinas voadoras azuis esperava. Vários visitantes estavam prontos para carregar as gaiolas para dentro. Logo depois que eram conferidas por um que parecia ser o chefe.
Como deveria dar o exemplo aquele comandante não comia há semanas, estava de pé por pura determinação e estimulantes que matariam qualquer humano. Sua atenção estava comprometida, talvez por isso ele não tenha percebido que seu dispositivo sensor apitou momentaneamente quando John Chosen estendeu a gaiola. Ele só tinha olhos para os ratos.
Somente o Padre Claudius reparou, e foi inteligente o bastante pra guardar a informação para si.
Capítulo X
Visitas Ilustres
John Chosen chegou na Pousada dos Anjos com uma carga de Kiwis, fruta preferida de sua mãe. Era uma forma de compensar a falta de atenção que ele estava dando às suas tarefas na pousada, mas com o mundo se acabando e nenhum hóspede, não fazia sentido manter tudo impecável.
Para surpresa de John seus pais tomavam café e conversavam alegremente com uma hóspede. Teria ela chegado no meio da tarde? A visitante falava muito, contava histórias da Corte, com a qual parecia bem familiarizada.
Uma jovem de vinte e tantos anos, era pequena, mas proporcional. Com seios brancos muito alvos, apertados em um espartilho, seus cabelos louros caíam como rios dourados emoldurando um rosto sorridente de bochechas coradas e enormes olhos azuis. Ela usava joias claramente dispendiosas, uma mini-tiara e brincos, ambos em forma de flor, 9 pétalas douradas circundando uma pérola. Completando um anel idêntico e uma pulseira quase na altura do ombro, com mais três flores iguais.
“Olá, você deve ser John! Eu me chamo Domitila, mas pode me chamar de Dommy”.
John reconheceu o nome dos pergaminhos de fofocas que lia na sala de espera do Dr Joaquim Xavier, seu dentista, mas foi educado o bastante para não mencionar as partes que questionavam a honra da donzela presente.
“Ei, a senhora é famosa, não é a chamada viscondessa com grandeza? ”
“Eu odeio esse título, John. Marquesa se quiser, Dommy de preferência. Estamos entre amigos”
Percebendo que o filho estava prestes a cometer uma gafe, Stephanny desarmou a situação:
“John, querido, acenda o boiler e prepare as cabras para girar os foles, acho que nossa hóspede vai querer tomar um bom banho de espuma, depois de uma viagem cansativa. ”
Encher o reservatório com água do poço era bem trabalhoso e cansativo, mas o pior era preparar e testar o mecanismo que os pais compraram de um italiano viajante, um tal de Jacuzzi. Em princípio um conjunto de rodas dentadas acionaria foles que fariam a água circular por entre a banheira, o aquecedor e uma entrada de ar, fazendo que que deliciosos jatos de água espumante massageassem a pessoa no banho. Na prática tudo vivia quebrando.
Para piorar a roda principal era movida por dois bodes, presente de um hóspede Norueguês, ou Sueco, algo assim. John os chamava de Tam e Tam, para simplificar. Afinal, de que adianta dar nomes a bichos que não atendem, são teimosos e só sabem fazer cocô em bolinhas? Estranho era aquele louro, que batizou bodes idiotas de Tanngrisnir e Tanngnjóstr.
“John, aceita mais um pouco de suco de Atemóia? ”
Esticando o copo John deixou que a nobre visitante o enchesse até a boca.
“Obrigado, sua alteza, digo, condessa, digo, Dommy”
O olhar de reprovação dos pais foi anulado pelo sorriso da hóspede. Apesar de uma guerra à sua volta, ainda havia momentos de paz e legítima alegria.
“Conte-me, qual o motivo de sua vinda a Tarituba afinal, Marquesa? ”
Norman finalmente fez a pergunta que todos tinham em mente.
“O motivo não posso revelar, meu hospitaleiro amigo, mas tenha certeza, é muito importante e o destino de nosso império pode depender do que eu encontrar na cidade. Aliás, John, muito bom o trabalho com os padrões de ataque”
O copo quase caiu. Ele não esperava que seu pequeno exercício desse em algo, mesmo com as promessas do Prefeito de que iriam notificar o Rio de Janeiro. Muito menos que a Segunda Mulher mais importante do Reino (ou a Primeira, diziam alguns) soubesse de sua existência.
“Foi só um golpe de sorte” – Explicou John, com uma humildade incomum
“Precisaremos de toda a sorte que pudermos encontrar” confessou a Marquesa de Santos.
“Estou exausta, bem como meu cavalo. Ele é uma excelente montaria, me salvou várias vezes quando fui perseguida primeiro por três invasores em estranhos cavalos sem patas, e depois quando mais dois tentaram me cercar. ”
John era só atenção.
“Eu achei que iriam me alcançar, mas quando atravessávamos a galope rápido o rio Manbucaba uma enxurrada levou os invasores, e pude finalmente chegar até Tarituba. Foi complicado, mas minha missão é mais importante que minha segurança”
A corajosa e nobre jovem se levantou, recolhendo de sua bagagem ainda na recepção uma caixa decorada com estrelas, luas e outros motivos astronômicos.
“Farei uma caminhada antes de meu banho. Tenho certeza de que John me avisará quando a água estiver no ponto, certo? ”
“Claro, alteza”
Do lado de fora a noite já se fazia madura, pirilampos disputavam o céu com as estrelas. A brisa de Outono movia levemente as folhagens, a Lua ainda tímida esboçava aparecer no horizonte.
A Via Láctea cortava o firmamento, um mistério a ser desvendado nos Séculos futuros.
Mesmo focada em sua missão a Marquesa não podia deixar de admirar a beleza do céu noturno, enquanto posicionava seus sextantes, astrolábios e bússolas. Localizando Polaris ela calibrou sua posição. Os instrumentos haviam sido encomendados a Joseph von Fraunhofer pelo Imperador em pessoa. Custaram uma fortuna, mas sua precisão era insuperável.
Refazendo seus cálculos pela terceira vez a Marquesa não conseguia acreditar. As coordenadas celestes apontavam para aquele ponto com uma certeza implacável. Como era possível que aqueles Maias, mortos tantos Séculos antes soubessem daquela cidade, daquele local, daquela casa? E ela nem havia sido informada do resto da Profecia.
Seria coincidência ela ter se hospedado no ponto focal? Seria sorte, destino ou ela estaria sendo manipulada por Forças além de sua compreensão? Uma mulher da Ciência, a Marquesa não gostava dos assuntos místicos, mas era inteligente o bastante para não ignorar sua existência.
“John, meu querido” gritou ela em direção à casa, onde o jovem carregava arduamente baldes de água em direção à caldeira “cancele meu banho, sele meu cavalo.”
Juntando suas anotações em um bolinho de papel embolado, a Marquesa puxou abriu uma das laterais do lampião de latão, incendiou um chumaço de palha e queimou todos os seus cálculos, cuidando para que os restos carbonizados fossem ao final pisoteados com suas botas de montaria.
Ela mal se despediu de todos, enquanto arrumava a pouca bagagem que trouxera e tomava um café reforçado. Uma cavalgada de 200Km não era para qualquer um, ainda mais desviando de patrulhas inimigas, mas era essencial que a informação chegasse até o Imperador e nenhuma ave-mensageira, nem mesmo os caríssimos falcões-peregrinos que o Alto-Comando das Forças Armadas usavam eram seguros o suficiente.
Tal como chegou a Marquesa partiu. Uma nota de rodapé na vida da Pousada dos Anjos, mas uma peça fundamental no futuro do Império, quiçá da Humanidade.
Capítulo XI
Band of Brothers
Das memórias de Pullo Vorenus, 1º Tenente da Companhia Eqqus, 506º Regimento de Infantaria, 101ª Divisão do Exército Imperial
“Dizem que o tempo cura todas as feridas, e confesso, publicamente dou essa impressão. Mesmo nas reuniões dos veteranos da Batalha do Palácio nos gabamos de nossos feitos e desprezamos o perigo. Só quando compartilhamos uma caneca de vinho com um amigo, ou ficamos sozinhos com nossos fantasmas reconhecemos que parte de nós ficou naquele campo de batalha, junto com tantos bons companheiros.
Hoje a cidade é outra. As cicatrizes da Grande Guerra não mais existem, foram substituídas por monumentos, mas eu não os vejo. Olho para os grandes obeliscos, os arcos triunfais e só vejo a dor o sofrimento e a desesperança, vejo as máquinas infernais do inimigo, nossas tropas impotentes diante de um poder muito superior.
O Jardim Imperial não me ilude. Eu vejo as paredes demolidas do Palácio, as tapeçarias ardendo, os criados correndo em busca de abrigo. Petrópolis nunca se esquecerá daquele dia.
Eu comandava o 2º Pelotão, fazendo a guarda do Palácio de Verão. A Guerra ainda não havia tocado minha bela cidade serrana, tínhamos a ilusão de que seríamos poupados. Ledo engano. Eu juntara minha tropa para a ordem do dia, quando bólidos cruzaram o céu, não como estrelas cadentes, mas como dragões, o que era impossível, essas bestas formidáveis não habitam nossas terras.
Mensageiros traziam notícias de bólidos caindo em vários pontos da cidade. Outras máquinas, lembrando pratos coloridos como vitrais sobrevoavam as casas, iluminando-as com um raio da luz mais branca, visível mesmo com a competição do Sol matinal.
Uma delas se fixou em cima do Palácio. Ordenei que meus mosqueteiros atirassem, mas a máquina não tomou conhecimento. O raio de luz foi ficando mais e mais fino, varrendo o prédio. Certa hora ele mudou de cor, fixo em uma posição. O objeto então subiu aos céus qual um profeta bíblico.
Achei que era o fim da invasão, mas informações mostravam que carroças sem cavalos, com grandes rodas de borracha haviam saído de dentro dos bólidos, e se deslocavam em direção ao Palácio.
Eu estava confiante que minhas defesas bastariam. Uma rede de trincheiras em volta do Palácio era complementada por atiradores de elite nas árvores e nos andares superiores. Enormes barreiras de argamassa e pedras espalhadas pela rua haviam sido colocadas para impedir cargas de cavalaria. Outros truques aguardavam qualquer invasor.
Como fui tolo. As carruagens deles dizimavam os soldados que tentavam chegar perto. Tiros ricocheteavam em suas carcaças de metal. No alto de um morro próximo um batalhão de artilharia zerou suas miras nos carros invasores, inutilmente. As balas de canhão resvalavam nas infernais máquinas, que então girando suas torres dispararam raios de luz mortal e pulverizaram meus bravos companheiros.
Quando as máquinas invasoras chegaram nas barreiras e pararam pensei que desistiriam, mas de suas portas traseiras desembarcaram soldados. Não eram homens, mas algum tipo de demônio. Muito magros e de aparência frágil, com roupas prateadas e portando estranhas armas que disparavam fogo e luz.
Eles começaram a se mover em direção ao Palácio, desviando dos obstáculos. Os tiros de mosquetes não penetravam em suas armaduras, mas os incomodavam. Infelizmente eles respondiam com suas armas muito mais poderosas. A placa peitoral padrão de nossos soldados era inútil. Vi vários companheiros caídos agonizando com enormes e fumegantes buracos no peito. Os mais afortunados jaziam decapitados.
Quando o grosso da tropa inimiga, que não deveria ter mais de 20 ou 30 soldados chegou em um determinado ponto ordenei meu esquadrão de morteiros que disparasse. Foi nossa primeira vitória. As bombas caíram bem no centro da formação, jogando vários invasores ao chão. Um foi atingido de forma certeira, e seu corpo havia sido cortado ao meio em uma explosão de estranhas entranhas verdes.
Isso não agradou aos invasores. Com minha luneta vi o que parecia ser o líder mexer em uma caixa. Segundos depois uma máquina voadora menor apareceu, rápida demais para nossos atiradores. Sobrevoando o palácio ela mudou de direção quando a guarnição de morteiros disparou uma nova salva. Caindo como um falcão mirando sua presa, a máquina explodiu tal qual um barril de pólvora, matando 5 de meus melhores homens.
Gritei para que meus atiradores de elite mirassem na caixa na mão do comandante inimigo. Meu instinto dizia que era importante, e que não estaria protegida como a armadura que usavam. A pequena explosão de faíscas acompanhada da queda da pequena e mortal máquina voadora confirmou minha hipótese. Uma das raras pequenas vitórias naquele dia terrível.
Eu não tinha esperanças que o portão do Palácio fosse deter os inimigos, mas foi triste vê-lo cair tão rapidamente diante de suas poderosas armas. Com confiança eles marcharam para dentro dos limites da casa do Imperador. Se eu tivesse tempo na hora, sentiria vergonha de ter falhado em minha missão.
A primeira leva de inimigos foi surpreendida por soldados com bacamartes em trincheiras ocultas, tampadas com alçapões e disfarçadas com folhagens. Eles só tinham um tiro, e todos menos um pereceram inutilmente. A couraça dos inimigos era forte demais. Eles reagiam aos tiros disparando de volta e transformando meus homens em poças de carne triturada.
Somente um, o maior de todos, um louro enorme chamado de Sueco por ninguém conseguir pronunciar seu nome conseguiu levar um inimigo junto. Ele pulou, derrubando o pequeno soldado adversário, e encostou seu bacamarte na altura do pescoço, forçando seu peso enquanto puxava o gatilho.
O disparo separou a cabeça do inimigo de seu corpo. O Sueco deu um grito de vitória enquanto três inimigos vingavam o companheiro morto destroçando a tiros meu amigo. Mesmo assim ele não morreu em vão. Contato direto poderia fazer a diferença.
Minha última linha de trincheiras não se mostrou páreo para os inimigos. Eles simplesmente jogavam esferas explosivas e aniquilavam os homens que se achavam protegidos pelos buracos que cavaram com tanto empenho. Dei a ordem para recuarem para dentro do Palácio.
Nossas cargas de baioneta se mostraram surpreendentemente eficazes, os invasores pareciam não estar preparados para aquele tipo de arma, mas invariavelmente meus homens eram mortos por suas vítimas.
O grupo de invasores parecia se dirigir para a Ala de Relíquias, onde o Imperador guardava seus espólios de guerra e artefatos recolhidos em viagens de exploração. Será que toda aquela carnificina se resumia a um roubo? Eu sabia que era meu dever morrer lutando. Através das passagens secretas contornei, com meus últimos três homens a força inimiga. Preparei um ataque com um velho truque que aprendi com um adido russo; garrafas cheias de álcool e breu, com um farrapo embebido preso ao gargalo. Acendemos e lançamos nos inimigos quando chegaram ao Salão das Armas.
Confesso que fiquei satisfeito ao ver nossos algozes ardendo em chamas. Não tão feliz fiquei quando o comandante deles, mais atrás e não atingido pelo fogo disparou sua arma contra os painéis de madeira que ocultavam meus homens. Sem resistência os painéis explodiram em pedaços. O inimigo então terminou o serviço disparando várias vezes em cada um dos soldados agonizantes.
Eu abri o painel onde me escondia, corri pelo salão disparando minhas duas garruchas. Acertei em cheio no peito de meu inimigo, que nem sentiu os tiros. Me refugiei atrás de uma pilastra enquanto ele atirava. O mármore incrivelmente polido resistia aos tiros, como se os refletisse. Tive uma idéia e pulando de pilastra em pilastra cheguei a uma vitrine que expunha uma baixela de prata inglesa. Quebrei o vidro com o cotovelo e peguei a enorme bandeja.
O Sol entrava pelo vitral do teto, destruído pela batalha. Usando a bandeja eu refleti seu fulgor no rosto de meu inimigo. Ele atirou em mim, e como imaginei, mirou na bandeja. O metal esquentou em minhas mãos, fagulhas saltavam, mas eu estava vivo.
Corri em direção ao inimigo, que agora eu reparava era bem maior que os outros. Da altura de um homem normal, tinha ombros largos e usava um capacete fechado, com um queixo protuberante. Seus braços e pernas eram musculosos. Todas as fibras do meu ser diziam que não deveria enfrentá-lo.
A bandeja estava vermelha em minhas mãos, mas eu não precisaria mais dela. Cara a cara com meu inimigo, acertei seu rifle com a bandeja, jogando-o longe. Surpreendido ele abriu a guarda e pude acertar um direto em seu estômago. Ele urrou como uma besta inumana, e rápido como um raio socou meu peito. Pude sentir pelo menos duas costelas se partindo.
A dor não era maior que a raiva. Por causa dele meus homens estavam mortos. Ainda no chão apliquei uma rasteira. Ele caiu ao mesmo tempo em que eu me erguia de começava a chutar sua barriga. Ele rolou para trás e puxou o que parecia um pequeno pedaço de metal, que cresceu por algum tipo de magia profana e se tornou uma lança, emitindo o que me pareciam relâmpagos.
Eu desviava de seus golpes, sentindo o ar crepitar quando a ponta da lança passava perto de meu rosto. Eu precisava de uma arma, por sorte havíamos chegado na ala japonesa. Sem pensar meu punho enluvado atravessou o vidro que protegia a espada que eu sabia ser a mais valiosa da coleção. Em 500 anos era a primeira vez que aquela Hatori Hanzo seria desembainhada.
Não pude contemplar aquela obra de arte por muito tempo. Em um golpe que tinha tudo para ser certeiro meu inimigo se lançou contra mim. Caindo de joelhos senti em minha cabeça o calor de sua lança, que perfurava como manteiga a pilastra de mármore. Pisquei para me livrar da poeira que caía em meus olhos ao mesmo tempo em que desembainhava aquela magnífica katana.
Eu tinha em minhas mãos a obra de um expert. Metal forjado com maestria centenas de vezes. Eu não via esse esmero na arma de meu inimigo.
Agradecendo as aulas que tive com o Mestre Mei em minha juventude, assumi posição de bloqueio no exato momento em que a lança descia para ceifar minha vida. A espada tremeu, se curvou e senti minhas mãos formigando, mesmo através do couro de minhas luvas, mas ela não se partiu.
Saltando para trás apontei a espada para meu adversário. Com a mão livre me permiti uma bravata, gesticulando ‘venha’.
Isso o irritou. Era o que eu queria. Desviava de seus golpes e contra-atacava. Faíscas saltavam de minha lâmina. Andávamos em círculos pelo salão. Na porta principal soldados inimigos se acumulavam, assistindo. Eu não sairia vivo dali.
Meu inimigo era incansável, mas parecia irritado. Seus golpes traziam mais raiva do que técnica. Isso me deu a brecha que precisava. Fingindo abrir mais a guarda, o convidei a tentar acertar meu flanco. Ele mordeu a isca. Ao invés de desviar segui em frente, ele perdeu a posição e minha Hanzo acertou em cheio sua mão. Nenhuma criatura, homem ou demônio resiste a aço samurai.
Ele urrou de dor, quase abafando o ruído de sua lança caindo ao chão. Sangue verde manchava os intrincados padrões do piso. Recuei, preparando um novo golpe, quando sua armadura começou a se mover sozinha. Um pequeno canhão apareceu em seu ombro. Assumi a posição de Shibutso, com o braço estendido segurando a katana na lateral, pronto para um golpe não forte mais rápido. Reparei então três traços vermelhos em minha luva, e foi a última vez que vi minha mão direita.
Um disparo do canhão acertou em cheio meu punho, minha mão foi destroçada. A dor me jogou ao chão. Instintivamente apertei a mão debaixo do ombro, rastejando e tentando alcançar a Hanzo com minha mão remanescente.
A perda de sangue tornou minha memória confusa, por muito tempo só me lembrei de fragmentos, só hoje tenho plena certeza do que aconteceu, nunca antes contei por ser por demais inacreditável.
Meu inimigo avançou, pegou a Hanzo e a observou com atenção. Gesticulou para um dos soldados que buscou a bainha caída, guarneceu a espada e a levou embora, com estranha reverência.
Eu só podia odiar em silêncio, mas ao invés de me matar meu algoz começou a rir, ou algo parecido. Em seguida pegou sua lança. A ponta rubra foi encostada primeiro em seu punho decepado. Ele gritou durante todo o processo. Feito isso, segurou a lança em minha direção, gesticulando. Eu entendi.
Estiquei meu punho, deixei meu inimigo cauterizar meu sangramento. A dor me fez quase perder os sentidos. A última coisa de que me lembro é de vidro se quebrando e uma pedra circular sendo levada da coleção de relíquias Maias.
Acordei surpreso por estar vivo e mais surpreso ainda por ver em meu cinto, bem presa a lança de meu inimigo. É uma arma magnífica e até hoje não aprendi todos os seus segredos, mas confesso, preferia a Hanzo. “
(CONTINUA NA PRÓXIMA SEMANA)
Eu sei, é algo muito idiota de se colocar em um ebook, mas assim é a vida.
Para baixar as versões mais atuais, acesse o site:
http://www.contraditorium.com/JC/