Quando os russos armaram a Pepsi até os dentes para vencer a Guerra das Colas
B97GFP Monument to Alexander Pushkin on Pushkinskaya Square

Quando os russos armaram a Pepsi até os dentes para vencer a Guerra das Colas

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Cupido Não Tem Bandeira (1961) é uma deliciosa comédia de Billy Wilder onde a filha de um executivo da Coca-Cola em Berlim se apaixona por um militante comunista. O filme tem ótimas espetadas no comunismo e no consumismo, adoro quando os apaixonadinhos contam que conseguiram um ótimo apartamento, só a uma curta caminhada do banheiro.

Em outra cena o enviado russo admite que estão negociando pois não conseguiram roubar a fórmula da Coca-Cola, e a cópia do produto que fizeram, a Kremlin Cola não deu muito certo. O americano zoa:

“Kremlin Cola… nem mesmo os albaneses beberiam aquilo”

Em verdade a Coca-Cola só foi introduzida (epa!) oficialmente na União Soviética em 1985, até então os russos só tinham acesso a Pepsi (vai, defende comunismo agora!). E isso foi fruto de uma estratégia genial que começou em 1959, indiretamente por causa do Presidente Dwight D. Eisenhower.

Para tentar melhorar o clima entre os dois países, Eisenhower propôs e Nikita Khrushchev topou uma Exposição Internacional entre os dois países, onde cada um mostraria o que tinha de melhor a oferecer. Em Moscou foi aberta a  American National Exhibition, onde os EUA entre muitas outras coisas mostraram uma casa de classe média, com todos os eletrodomésticos da época.

Isso gerou uma grande discussão entre Khrushchev e o então Vice-Presidente dos EUA, Richard Nixon. Khrushchev simplesmente não aceitava que aquela era uma casa real. Em verdade era, foi uma cópia de uma casa de uma família totalmente mediana, mas para os padrões soviéticos parecia ficção científica.

Quando Khrushchev começou a suar e bufar, um sujeito perguntou se ele não aceitaria tomar um refrigerante no stand ao lado. O sujeito era um jovem executivo,  Donald M. Kendall, chefe das operações internacionais da Pepsi. Chegando no Stand ele deu o copo ao Premier Soviético, que bebeu. Imediatamente Kendall perguntou se  Khrushchev gostaria de provar uma Pepsi feita com água de Moscou, e não água americana. Khrushchev topou e declarou feliz que a Pepsi russa era muito melhor.

A foto do momento em que Khrushchev bebia a Pepsi correu o mundo e estrelou a campanha da empresa, “Os Sociáveis Bebem Pepsi”, fazendo o trocadilho com socialistas. Com esse primeiro pé no país, Kendall começou longas e intermináveis negociações para fabricar e vender Pepsi localmente. Ele só conseguiu isso em 16/11/1972, mas havia um pequeno problema.

O Rublo não era conversível. Você não podia trocar rublos por dólares, a Pepsi só poderia gastar seus lucros dentro da União Soviética, o que é ótimo para os comunistas mas péssimo pros investidores. No acordo isso foi resolvido com a prática comercial mais antiga do mundo – e- ok a mais antiga é a prostituição. A segunda mais antiga, o escambo:

O lucro da Pepsi seria convertido em… vodca. No caso Stolichnaya, da qual a Pepsi se tornou representante exclusiva nos EUA.

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Trocar Pepsi por vodca é uma idéia excelente, e deu muito certo. Os russos adoraram também, tinham acesso a um gostinho do capitalismo, se bem que demorou. Com a típica eficiência estatal soviética atrapalhando, a primeira fábrica foi aberta em 1974, mas a Pepsi só começou a ser distribuída em massa em 1979.

A grande ironia é que enquanto os comunistas daqui chilicavam chamando a Coca-Cola de “sangue negro do capitalismo”, os comunistas russos faziam fila para beber Pepsi.

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A Coca-Cola só conseguiu permissão dos russos para vender seu sangue negro do capitalismo em 1985, o acordo original deu uma imensa vantagem competitiva à Pepsi, que já era vista como produto local, mas o acordo venceu em 1989. Como não era atraente a hipótese de sair da União Soviética, a Pepsi propôs um investimento monstruoso, equivalente a US$6 bilhões atuais.

Os russos aprovaram, mas não dava pra ser pago em vodca. Embora um russo médio não considere grande desafio beber US$6 bilhões em Stolichnaya, era birita demais pra ser desovada no resto do mundo. A solução? Principalmente, submarinos.

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Os soviéticos tinham literalmente milhares de toneladas de barcos e navios (submarinos são tecnicamente barcos) abandonados nos portos. Há um mercado para isso, eles propuseram entregar à Pepsi o equivalente a US$6 bilhões em embarcações para desmonte e reciclagem.

Por causa disso a Pepsi recebeu 10 navios civis, entre tanque e cargueiros, 1 cruzador, uma fragata, 1 destroyer e nada menos que 17 submarinos. Convencionais, não nucleares, infelizmente.

Essa esquadra tornou a Pepsi a 6a maior potência global em termos de submarinos, e a Coca-Cola ficou bem feliz de sua sede ser em Atlanta, bem longe do mar.

Como não poderiam atacar a rival, o jeito foi vender tudo pra uma empresa sueca, que desmontou e reciclou as embarcações.

Infelizmente para a Pepsi, quando a União Soviética foi pra vala em 1991 o povo queria distância de tudo que lembrasse o regime comunista, estavam desesperados por produtos de consumo e liberdade, principalmente produtos de consumo, e nem as reformas de Gorbachev conseguiram manter o país inteiro. Para ter uma idéia de como o povo estava, veja a abertura do primeiro McDonald’s na Rússia, em 1990:

Como resultado a Coca-Cola, que era muito mais nova no país e era vendida como símbolo do capitalismo tomou o mercado totalmente. Assim como o comunismo o reinado da Pepsi na Rússia havia sido relegado aos livros de História.

BÔNUS

Assim que a Segunda Guerra Mundial acabou o cidadão da esquerda teve um problema, por causa do cidadão da direita:

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O cara da direita é o então apenas General Eisenhower, Supremo Comandante das forças expedicionárias aliadas na Europa. O da esquerda é o também então apenas general Georgy Zhukov. Em um dos muitos jantares oficiais Eisenhower apresentou a Zhukov sua bebida preferida: Coca-Cola. Zhukov ficou viciado, mas quando as relações entre os dois países começaram a azedar, pegou mal pra um general soviético aparecer em público bebendo Coca-Cola.

Zhukov pensou em uma alternativa: perguntou ao General Mark Clark, que comandava o setor aliado na Áustria se seria possível fabricar Coca-Cola com aparência e embalagem de vodca.

Clark deve ter achado o pedido divertido, e o repassou até o Presidente Truman, que por sua vez fez a solicitação a James Farley, Chairman da subsidiária da Coca-Cola que cuidava da área de exportações. Seu projeto incluía a implantação de 38 fábricas espalhadas pela Europa, incluindo uma na Áustria. Farley achou o engenheiro químico certo e décadas antes da Pepsi Cristal, era produzida uma Coca-Cola transparente.

A bebida foi envasada em garrafas simples de vidro transparente (Coca-Cola vinha em garrafas de cintura fina, de vidro verde) e marcadas com uma estrela. O primeiro suprimento de 50 caixas foi enviado para Zhukov, e tudo indica que ele adorou e por muitos anos bebeu toneladas de “vodca” publicamente sem ninguém o acusar de traidor do socialismo.

Um efeito colateral foi que os carregamentos de suprimentos para a fábrica da Coca-Cola, que ficava na parte da Áustria controlada pelos soviéticos passavam pelas barreiras sem problema, todos os outros carregamentos levavam semanas entre inspeções e entraves burocráticos.

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