O dia em que a Natureza se vingou e matou milhões de comunistas

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Trofim Lysenko é um dos maiores assassinos da História, mesmo que seu nome não apareça junto de Pol-Pot, Stalin ou Hitler. As mortes que ele causou têm um sabor mais amargo ainda pois foram fruto de pura pseudociência.

Lysenko era Diretor da Academia Soviética de Ciências Agrícolas, e chapa de Stalin, se bem que para ter cargo graúdo naquela época, só sendo chapa de Stalin mesmo.

No começo do Século XX a Teoria da Evolução ainda não era aceita como é hoje, A Origem Das Espécies só foi publicado no final de 1859, e muita gente como Lysenko ainda achava que o Lamarckismo era uma teoria mais adequada.

Segundo a Teoria da Seleção Natural de Darwin, girafas com pescoços maiores conseguem alcançar folhas mais altas, com isso sobrevivem em épocas de escassez de alimento, enquanto as girafas de pescoço curto morrem de fome. Com o tempo nascem mais girafas pescoçudas (menos na Amazônia, RIP in Peace girafinhas) e folhas mais altas ainda são comidas.

As girafas se especializam em comer folhas altas, inacessíveis a outros animais, e bingo, temos um nicho ecológico preenchido.

Já segundo as idéias de Lamarck, as girafas se esticavam para comer folhas altas, e esse esforço de esticar o pescoço fazia com que essa característica fosse transmitida para as novas gerações, uma espécie de musculação genética.

Em síntese, o Lamarckismo acredita que espécies podem alterar sua composição genética para repassar características desejáveis aprendidas por experiência. Lysenko ia além, ele rejeitava seleção natural darwiniana, e o próprio conceito de hereditariedade de Mendel.

Para provar sua teoria, Lysenko seguiu o caminho mais rápido: Falsificou pesquisas “provando” seu conceito de Cooperação Natural, que coincidentemente se encaixava certido com a filosofia comunista. Também apresentou trabalhos onde teria induzido (provavelmente via tortura) sementes de centeio a se transformarem em trigo, e depois em cevada.

Usando de sua influência Lysenko prometeu quadruplicar a produção das fazendas soviéticas, devastadas pela coletivização forçada, mas claro que suas técnicas não deram certo, mas seu foco era destruir o inimigo: A genética. Stalin foi convencido a mandar pra sibéria mais de 3000 biólogos que não compartilhavam de suas idéias, um número incerto deles acabou morto, incluindo Nikolai Vavilov, Presidente da Academia de Agronomia, preso em 1940 e morto em um gulag em 1943.

Em 1948 Lisenko conseguiu literalmente banir a Genética da União Soviética, ela foi definida como “pseudociência burguesa” e proibida. Todos os geneticistas do país foram demitidos, proibidos de trabalhar e suas pesquisas suspensas e destruídas. A genética só começou a sair do ostracismo na URSS no final dos Anos 1960.

É esperado que um exemplo de suprema arrogância, uma ignorância da Ciência com base em pura ideologia tenha servido de lição, certo? Não exatamente. Em 1958 outro paraíso do proletariado, a China de Mao Tse Tung decidiu realizar mais um de seus grandes experimentos, como parte do Grande Salto Adiante.

Sem entender que a queda na produção das fazendas veio da coletivização e da remoção compulsória de mão de obra do campo para alimentar as novas indústrias que a utopia socialista exigia, os burocratas chineses resolveram colocar a culpa de todos os problemas da China em algumas espécies tidas como nocivas. Não, Trump e Bolsonaro ainda não eram nascidos.

O alvo eram ratos, mosquitos, moscas e… pardais.

Os três primeiros a gente compreende, o mosquito é o animal que mais mata gente até hoje, ratos e moscas destroem reservas de comida e transmitem doenças, mas e os pardais?

Como bons burocratas, os dirigentes comunistas se basearam no que eles achavam ser a realidade, e não se preocuparam em consultar cientistas. Para eles eram verdadeiras as reclamações de alguns fazendeiros, de que pardais comiam as plantações.

Na Campanha das Quatro Pragas (除四害运动) a população foi incentivada a matar e recolher os bichos nocivos, o que resultou, entre outras coisas, em 10886 toneladas de mosquitos.

Infelizmente também resultou em 1 bilhão de pardais mortos. Adultos usavam espingardas, crianças usavam pedras e atiradeiras, subiam em árvores, destruíam ninhos e quebravam ovos.

Nos primeiros dias só em Pequim 3 milhões de pessoas se reuniram para caçar pardais, batendo tambores e panelas (viram? Comunista também bate panela) espantavam os pássaros, que voavam até cair de exaustão, quando eram mortos pisoteados.

Muitos se refugiaram em embaixadas estrangeiras. A população tentou invadir a embaixada da Polônia, que estranhamente não deixou os invasores entrarem. Em uma repetição do Cerco de Jericó, cercaram o embaixada e bateram tambor por dois dias, ao final os poloneses tiveram que usar pás para recolher tantos pássaros mortos.

Enquanto a campanha prosseguia com entusiasmo, cientistas estudavam os pássaros e corriam para alertar os líderes, mas eram ignorados. Em 1960 Tso-hsin Cheng, um ornitólogo de renome mundial finalmente conseguiu convencer Mao, mostrando dados de autópsias que demonstravam de forma irrefutável que a a maior parte da dieta dos pardais não eram grãos, mas insetos.

Em Abril de 1960 os pardais foram retirados da lista das Quatro Pragas e substituídos por percevejos, mas era tarde demais. Eles não só comiam insetos, como sua refeição preferida eram… gafanhotos. Sem os pardais a população de insetos explodiu, plantações foram devastadas por todo tipo de praga de seis pernas (não, seu trouxa, Sleipnir, o cavalo de Odin tem 8 pernas, não quatro, ele é obviamente um aracnídeo).

A produção agrícola começou a decair vertiginosamente, chegando a mais de 70% em sua redução. Não que o desflorestamento e práticas predatórias não tenham ajudado, mas o desequilíbrio ecológico criado com o genocídio dos pardais foi o principal causador da Grande Fome, que matou de inanição 45 milhões de chineses entre 1959 e 1961.

Pelo menos há uma luz no fim do túnel. A China aprendeu a lição, tanto que em 5 de Setembro de 2017 um sujeito chamado Tongxiang foi em cana. Seu crime: Matar 44 pardais.

Talvez ele fosse um velho saudosista, ou um revoltado qualquer, o fato é que ele passou por um campo, viu muitos pardais, voltou no dia seguinte com uma rede e cometeu o crime. Sim, crime. Na China é proibido matar, vender ou comer pardais, e quando a China diz que algo é proibido de se comer, é caso sério.

Até 20 pardais mortos, é contravenção, mais de 20 é crime mesmo.

Essa Lei não surgiu por amor aos pássaros, nem mesmo por respeito à Ciência. Ela é fruto do puro medo, pois os líderes chineses descobriram que a Natureza não está nem aí pra sua arrogância, seu discurso ideológico e sua superioridade moral. Se você bater na Natureza, ela bate de volta. E forte.


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