Vacinas do COVID são magnéticas? Pergunte a uma criança.

Vacinas do COVID são magnéticas? Pergunte a uma criança.

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ban-34-1024x437 Vacinas do COVID são magnéticas? Pergunte a uma criança.

As Interwebs estão fervilhando com notícias de que a Vacina do COVID tem propriedades magnéticas, comprovadas com um simples teste. Você encosta uma moeda no local da vacina, e ela fica grudada, como mágica. Curioso: Não importa qual, aparentemente TODAS as vacinas, mesmo feitas com tecnologias fundamentalmente diferentes, apresentam o mesmo efeito magnético.

As conclusões seguintes dependem do grau de sanidade da pessoa.  Alguns acham que é um efeito colateral de algum componente na vacina, outros que faz parte de um plano das Elites Ocultas para monitorar as pessoas. Houve até quem apontasse uma conspiração Illuminati para matar um bilhão de pessoas com o apertar de um botão.

Antes de tudo, vamos esclarecer: NÃO existe vacina magnética, NÃO existem super-nanopartículas quânticas paramagnéticas ou nenhuma dessas bobagens que soam científicas, mas servem apenas para assustar as pessoas. Mesmo assim, eu falar que não existe isso de vacina magnética se torna uma questão de confiança, e o “outro lado” tem até um experimento provando sua afirmação. Ou não tem?

Toda a história da vacina magnética se baseia em alguns conceitos simples de entender, como Viés de Confirmação e Causalidade. As pessoas se sentem confiantes por ter feito o experimento, acham que estão aplicando Ciência para desmascarar a Má Ciência, mas estão apenas praticando ciência ruim.

OK, primeiro vamos tirar de campo a história da Vacina Magnética. De tempos em tempos canais de TV vagabundos (estou olhando para você, History) produzem segmentos sensacionalistas com “milagres” e eventos paranormais. Um dos mais populares são as pessoas com “poderes magnéticos”, que curiosamente não se propagam, dependem de o objeto estar encostado na pele, tipo isto:

https://youtu.be/1HFk4ZlVuBs
É o único persa do mundo que raspa os pelos do corpo.

Como sempre os jornaleiros apenas reportam, não fazem um questionamento, não consultam um cientista de verdade, apenas repetem as bobagens que o paranormal fala. O tal “magnetismo”? É um velho e barbudo truque que se resume ao sebo natural da pele humana. Isso mesmo, a pele da gente tem uma camada de óleos naturais, que tende a se acumular. Qualquer coisa razoavelmente lisa gruda nela, se for em uma área sem pelos. Pode testar.

Como anular esse efeito? James Randi, o famoso mágico e desmascarador de picaretas demonstrou na TV japonesa, usando… talco. O mais triste é ver a platéia, de forma bovina se espantar com os “poderes” do idiota pseudomagnético:

Existem várias formas de investigar essa alegação da vacina magnética, mas elas exigem algo que é mais raro do que dentes em galinhas: Curiosidade.

Carl Sagan dizia que toda criança nasce cientista, até os adultos extinguirem essa qualidade nelas. Crianças são curiosas, crianças querem saber como as coisas funcionam. Crianças olham o mundo à sua volta como um grande livro cheio de perguntas e respostas, elas experimentam, criam hipóteses, fazem conjecturas, testam suas idéias para descobrir se elas são comprovadas pela experimentação.

Toda criança é versada no Método Científico, já os adultos se contentam com a resposta mais simples.

Viés de Confirmação

Uma das maiores bobagens que são repetidas todos os anos é aquilo de que “sempre chove em Finados”. Neste artigo aqui eu detalho essa crendice que não faz o menor sentido se você pensar por mais de 30 segundos. Sempre chove onde, no mundo todo? Isso não seria motivo de manchetes globais? Aonde estão as fotos da NASA com cobertura de nuvens em 100% do planeta todo dia 2 de Novembro?

O que acontece é que toda vez que não chove em Finados, as pessoas ignoram, é o famoso “sempre que eu lavo o carro, chove”. Não, você não é o Centro do Universo. Você só não lembra de todas as vezes em que lavou o carro e não choveu, pois isso não é um incômodo.

Em Ciência uma parte extremamente importante ao se formular uma hipótese e testar com um experimento, é tentar de todas as formas provar que ele está errado. Você tem que se dedicar a estudar seu resultado e imaginar como ele poderia ser conseguido, por meio diferente da sua hipótese.

Você nunca, jamais faz um único experimento e se ele concorda com sua hipótese, dá como encerrado.

Esse viés de confirmação no caso da vacina magnética colocou um monte de gente cientificamente ignorante, desconfiada de tudo e todos diante de uma demonstração dramática que aparentemente comprovava a conspiração. A moeda grudou? Só pode ser magnética.

Ninguém se deu ao trabalho de testar o alcance do tal magnetismo, ou encostar uma bússola para ver se a agulha era afetada. Bolas, ninguém nem se deu ao trabalho de encostar a moeda no outro braço.

Um simples e rasteiro teste seria usar um grupo de controle, ou seja: Pegar alguém que não havia sido vacinado e fazer o teste da moeda.

Correlação Não Implica Causalidade

Um caso clássico a Engenharia de Sistemas envolve um sujeito que chegou na autorizada com um problema cabeludo: O carro dele, 0km dava problema para ligar, quando ele ia na sorveteria, mas só quando ele pedia um sorvete de baunilha.

Os mecânicos riram, não fazia sentido. O cliente insistiu, o chefe dos mecânicos acompanhou. Realmente, quando o sujeito chegava, estacionava, entrava, pedia o sorvete de baunilha e voltava pro carro, o motor afogava. Se ele pedisse outros sorvetes, tudo funcionava.

Depois de muito bater cabeça, descobriram: Como o sorvete de baunilha era o mais acessível, era servido rapidamente, não dava tempo pra gasolina descer do carburador, e o motor afogava. Os outros sorvetes tinham que ser buscados mais ao fundo do congelador, demoravam mais.

Embora houvesse uma correlação entre o sorvete e o defeito, o sorvete não era o CAUSADOR do defeito.

Não há nenhuma correlação entre a vacina e o “efeito magnético”, ela só aparece porque todo mundo que está fazendo o tal teste foi vacinado.

Essa histeria é preocupante, e por mais que eu adore falar mal do nosso sistema educacional, é algo mundial. As pessoas querem um momento “peguei você”, e abrem mão de toda e qualquer racionalidade. Vide essa dona que foi num comitê de saúde em Ohio denunciar a “vacina magnética” e depois de colar a chave no peito, tentou no pescoço e, claro, não funcionou. Ela provavelmente tomou banho, a sala tem ar-condicionado forte e a pele não estava gordurosa o suficiente.

Provavelmente ela sequer havia tentado antes, mas a convicção de UM experimento bem-sucedido foi suficiente para ela simplesmente acreditar na certeza de sua opinião.

As pessoas estão repetindo o “experimento” e replicando os vídeos, sem pensar, porque nunca foram ensinadas a isso. Ninguém pensa “hum, interessante. Em que condições consigo replicar esse efeito? Será que isso é magnetismo mesmo?”

Um experimento banal pode responder isso. Todos sabemos que magnetismo atravessa materiais como papel e pano. Então, por pura lógica, uma manga de camisa não deve afetar o magnetismo da vacina, certo?

Eu fiz o experimento. Obviamente a moeda cai no momento em que tento grudá-la por sobre a camisa. Já se colo um ímã de Neodímio no braço, boto a camisa por cima e encosto a moeda, ela fica fixa. Quod Erat Demonstrandum, magnetismo de verdade atravessa tecidos.

A graça da Ciência é que você não precisa de um LHC pra fazer Ciência, por milênios só tivemos nossas mentes e nossos sentidos. Eratóstenes mais de dois mil anos atrás mediu a circunferência da Terra usando matemática e sombras. É uma vergonha ainda termos terraplanistas. Vacinas vem salvando vidas por mais de 200 anos. Não temos mais pólio ou varíola, gerações desconhecem o que é um pulmão de aço.

Não peço fé na Ciência, peço apenas confiança, e acima de tudo, bom-senso e ceticismo, mesmo quando as “respostas” foram completamente de acordo com o que você acredita. Não existe vacina magnética. Vacine-se. COVID mata, Vacinas salvam vidas.

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