Em 4 de outubro de 1957 os EUA entraram em pânico. Guerra Fria correndo risco de esquentar, Europa toda ouriçada, os comunistas vão e me lançam um satélite, uma bola de puro perigo vermelho voando impunemente sobre os Estados Unidos, emitindo seu ameaçador bip… bip… bip…
A mídia ajudou a amplificar o medo da população, o Perigo Vermelho era real e imediato.
Quem realmente sabia o que estava acontecendo também estava com medo, mas por motivos reais: O Sputnik havia sido lançado em um R7 modificado. O R7 era o primeiro míssil balístico intercontinental da União Soviética. Ao lançar o Sputnik, os russos passavam o recado de que “podemos bombardear vocês quando quisermos, ianques”.
Para quem trabalhava ou acompanhava o incipiente programa espacial (na verdade havia vários, Força Aérea, Exército…) dos EUA, o Sputnik não foi surpresa, era fato notório que os russos estavam bem mais adiantados. Tanto que o primeiro satélite americano, o Explorer 1, só foi ser lançado em 1º de fevereiro de 1958.
Pessoas normais correriam atrás do prejuízo contratando uma baciada de engenheiros e cientistas, mas as cabeças pensantes do Governo dos EUA sabiam que cientistas alemães de passado duvidoso não iriam viver para sempre. Era preciso garantir não só o presente imediato, mas também o futuro. Ao invés de construir um abrigo, era mais inteligente plantar sementes à beira da estrada, mesmo que levassem anos para se transformar em árvores.
Comissões foram criadas, grupos de estudo montados, com um único objetivo: Não deixar os EUA ficarem para trás em Ciência e Tecnologia. Depois de muita deliberação, em setembro de 1958 o Presidente Eisenhower assinou o National Defense Education Act (NDEA), Lei Nacional de Educação para a Defesa. (cuidado, PDF)
O NDEA aglutinava uma série de iniciativas para promover STEM, sigla em inglês para Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática, campos onde os EUA estavam gravemente deficientes. Havia pouco interesse em áreas mais “teóricas”, justamente as mais necessárias em uma época em que eletrônica sofisticada e computação estavam saindo dos laboratórios e entrando no mercado profissional.
Os objetivos principais do NDEA:
- Aumento do financiamento para educação e treinamento nas áreas de ciência, tecnologia, engenharia e matemática (STEM)
- Melhoria do acesso ao ensino superior para estudantes de uma gama mais ampla de níveis de renda
- Aprimoramento dos serviços de orientação vocacional e aconselhamento para estudantes
- Maior investimento na formação de professores e no desenvolvimento profissional
- Expansão da força de trabalho docente nas áreas de STEM
As ações foram se capilarizando até os governos municipais, com investimento em cima de investimento. Por exemplo:
Em 1965-66, a Califórnia alocou US$ 2,1 milhões (US$21 milhões em valores de 2024) para o Título III, que foi usado para:
- Comprar novos equipamentos e materiais de laboratório para escolas de ensino médio
- Treinar professores no uso de recursos audiovisuais e outras tecnologias educacionais
- Estabelecer uma rede estadual de supervisores para fornecer assistência técnica aos professores
O NDEA não resolveu nenhum problema imediato, não foi uma ação típica de Governo, populista feita para agradar políticos e distrair pessoas. Foi algo planejado para durar anos, ninguém recebeu dinheiro e virou cientista de foguetes no dia seguinte. Não havia sequer garantia de que os estudantes seguiriam as carreiras desejadas.
Embora de abrangência global, o NDEA teve especial efeito entre minorias, como negros e pobres, e negros pobres. Jovens que não teriam condições de fazer um curso superior tiveram acesso a bolsas de estudo, e suas escolas e faculdades receberam investimentos, que resultaram em uma taxa de evasão inferior a outros estudantes.
Em setembro de 1962 John Kennedy fez seu famoso discurso prometendo colocar um Homem na Lua antes do final da década. Ele estava começando a colher os primeiros frutos do NDEA, o entusiasmo do programa espacial e a conversão dos EUA de um país industrial para um país tecnológico demandou mais e mais trabalhadores qualificados, que agora existiam.
Os EUA que a gente vê hoje como potência tecnológica são uma realização recente. Até a virada do Século XX eram essencialmente uma nação agrária, seu processo industrial foi lento e gradual, além de terem perdido 10 anos de desenvolvimento com a Grande Depressão.
Só com a 2ª Guerra Mundial começaram a deslanchar, e logo o PIB dos EUA era muito maior do que o dos Aliados e do Eixo, combinados. O país era uma máquina de fazer… qualquer coisa. Chegaram a produzir um navio Liberty e meio… por dia.
Se tivessem se mantido como potência industrial, hoje estariam acabados, a cadeia produtiva foi toda parar no Oriente. Felizmente gente de visão investiu em educação, e continuaram investindo. Em 1965 Lyndon Johnson promulgou a Higher Education Act of 1965 (Lei da Educação Superior de 1965) , um pacote de medidas para aumentar a qualidade do Ensino Superior, bem como facilitar a entrada de novo estudantes, incluindo minorias e gente de baixa renda, via bolsas de estudo e outros programas de incentivo.
De lá pra cá a Lei vem sendo aprimorada e renovada a cada quatro anos, e o resultado é evidente.
O brasileiro adora chamar americano de burro, e em parte é verdade. O americano médio é burro feito uma porta, mas o mundo não é feito por NPCs. Não é gente burra quem desenvolve vacinas, constrói foguetes, cura doenças e pousa na Lua.
Gente burra existe em todo lugar, a diferença é que alguns preferem focar em gente inteligente, investir nos jovens e colher os resultados. Por isso os EUA já ganharam mais de 400 prêmios Nobel, e o Brasil, o País do Futuro, continua chupando dedo.