A brigada politicamente correta vai ter um ataque cardíaco. Afinal convenhamos, dançar “I’ll Survive” diante dos portões de Auschwitz e outros campos de concentração na Europa é algo ofensivo, feio, desrespeitoso e digno das mais altas reprimendas, correto?
Felizmente a brigada PC não existia e os prisioneiros de campos de concentração só precisaram lidar com um grupo bem mais razoável, a Gestapo, que tentou privá-los de suas vidas, seus bens, seus familiares, sua dignidade mas não chegou ao ponto que os moralistas de hoje consideram normal: Tirar nosso senso de humor.
Exato, foi esse o segredo da sobrevivência dos judeus, não só na Alemanha Nazista mas por tuda sua história. O Bom-humor, efeito colateral (e ao mesmo tempo estimulante) da inteligência. É a diferença entre rir de si mesmo e sentir pena de si mesmo.
O humor judaico é tão forte, foi tão usado como ferramenta de SOBREVIVÊNCIA, que no verão de 1943 no campo de extermínio de Dachau os prisioneiros fizeram uma PEÇA, satirizando os alemães, tão brilhantemente escrita por Rudolf Kalmar, também prisioneiro, que os guardas da SS na platéia não perceberam que Hitler e o próprio nazismo estavam sendo sacaneados. Nas palavras de Kalmar, “Fizemos algo que deu força a nossos camaradas. Fizemos os nazistas parecerem ridículos”.
Quem demanda pena nunca recebe respeito verdadeiro. Uma postura solene no fundo é defensiva. Só é possível ser realmente vitorioso quando você olha na cara do inimigo não com raiva, mas com escárnio. Ele não é digno de seu ódio, no máximo seu desprezo, mas não o desprezo com medo, o desprezo de algo inofensivo.
Como no caso de Jane Korman. Essa artista judia (pode falar judia? Se não puder, foda-se) criou a peça “Dancing Auschwitz“. onde não só ela como três gerações de sua família, começando com seu pai, um sobrevivente de Auschwitz de 89 anos aparecem dançando “I’ll Survive”, diante de vários campos de concentração nazistas.
A declaração é mais eficiente que qualquer bravata, os (não tão) poucos discípulos de Hitler tomarão (corretamente) como um tapa na cara. A mensagem aliás nem está correta. Não é “I’ll Survive”. São três gerações, filhos e netos, o correto é “I SURVIVED”, sem pena, sem misericórdia, sem mimimi.
Acima de tudo, com BOM HUMOR, coisa que gente que leva tudo a sério é incapaz de compreender. Talvez por isso os politicamente corretos não sobrevivam nem a uma piada, que dirá a um Holocausto.
Não é preciso patrulhar as ruas da Internet atrás de piadas ruins, meus caros amigos escolhidos. Vocês estão muito acima disso. Uma piada de judeu ruim tem que ser respondida com uma piada excelente, não com perseguições. Quem perseguia humoristas era o outro lado, os caras maus, o baixinho com bigode de depilação íntima.
Fico triste de ver uma perseguição a humoristas ruins, um Comando de Caça aos Comediantes como está acontecendo hoje, no mínimo é melancolicamente irônico ver humoristas sendo perseguidos e comparados a gente ruim que prendeu e matou comediantes, judeus ou não, apenas por criticar o regime e seus líderes.
Mais triste ainda é ver que a fúria está cegando as pessoas até para as sábias palavras do Talmud.
Reza a história que um rabino perguntou ao Profeta Elias se alguém no mercado iria teria um lugar no Pós-Vida.
O Profeta aponta para dois badchanim, comediantes, cômicos de rua. Ele explica que o trabalho deles é fazer as pessoas rirem, elevar o espírito humano através do humor, do riso. Que ganharão a redenção por fazerem os outros felizes.
Por mais que eu questione a qualidade do trabalho do Danilo Gentili fazendo standup (escrevendo e no talk show é ótimo), ele ainda é um comediante. Já vi muitas platéias rindo das besteiras dele. Ninguém saiu odiando ninguém, ninguém cometeu crime nenhum. Nem ele, pois naquele intervalo entre o fim da 2a Guerra Mundial e ontem não era crime tentar ser engraçado. Hoje, não sei.
Só tenho medo de estar vivendo no pior dos mundos, um mundo onde até os judeus perderam o senso de humor.