O Rambo Gay nazista comunista católico que ajudou a comandar o mais ousado ataque da 2ª Guerra

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O HMS Hood, jóia da coroa e nau capitânea da frota inglesa quase nem viu o que o atingiu. No papel ele seria razoavelmente comparável ao encouraçado Bismarck, sendo inclusive mais pesado, mas o Bismarck contava com o dobro do armamento e muito mais alcance. Em uma batalha absurdamente desigual o Hood explodiu depois de ter seu depósito de munição atingido, dos 1418 homens a bordo, somente três sobreviveram.

O Bismarck era o horror dos ingleses, e só graças a um golpe de sorte e a decisão do capitão de afundar o próprio navio para evitar captura ele foi para o fundo do Atlântico em 27 de Maio de 1941, mas um mês antes disso estava sendo comissionado seu irmão gêmeo, o Tirpitz.

Obcecado com afundá-lo, Winston Churchill ordenou nada menos que 26 ataques ao Tirpitz, que ficava principalmente no Mar do Norte e na costa da Noruega, servindo como um curinga para Hitler. O medo do navio ser usado levou a um plano que se tornou a operação mais ousada de toda a Segunda Guerra Mundial.

O alvo? Este lugar aqui:

Essa é a Doca-Seca da Normandia, no porto de St Nazaire, na França. Era a única doca-seca grande o bastante para um navio como o Tirpitz, com suas 42900 toneladas, 251 metros de comprimento e 36 metros de largura. Caso os aliados fossem bem-sucedidos em um ataque, seria ali que ele seria consertado.

O problema é que não há muito o que destruir em uma doca-seca, a única parte realmente vulnerável é o portão, mas em 1942 não havia como mirar em um alvo tão pequeno de um bombardeiro. Pra piorar, do lado do porto havia isto aqui:

É a Base de Submarinos de St Nazaire, e Hitler adorava aqueles submarinos. Tudo que tivesse um cano e fizesse pewpewpew ou ratatata estava apontado pra cima naquela região, um ataque aéreo estava fora de cogitação. E nem chegamos na parte onde ataque de precisão na época significava você acertar o mesmo continente do alvo.

Havia pelo menos 18 fortificações entre a boca do Loire e o mar aberto, um ataque naval seria igualmente suicídio. Redes impediam a aproximação de submarinos também.

Era imperativo destruir as comportas da doca, mas como? Era uma missão impossível, e no final a única solução foi pensar em um ataque impossível, algo tão ousado, fora da caixa e exagerado que nenhum alemão esperaria.

Graças aos nerds do Ministério da Guerra, descobriram que uma maré especialmente alta 28 de Março de 1942 tornaria navegáveis as águas do estuário do Loire, longe do canal central, fortemente vigiado. Outros nerds calcularam que se removessem bastante equipamento de um destróier, ele ficaria leve o suficiente para conseguir navegar fora do canal.

A Marinha Real não queria participar do ataque, a avaliação oficial era que a missão tinha mínimas chances de sucesso e eles iriam perder um navio à toa, mas depois de muita pressão acabaram oferecendo o HMS Campbeltown, um destróier americano da 1a Guerra doado aos ingleses.

Era um navio lento, ruim de manobra e totalmente inadequado, mas era o que tinham. Em dez dias removeram tudo que havia de pesado, incluindo os canhões. Chaminés foram cortadas, placas soldadas e, se um sentinela nazista míope sem óculos cansado e de noite olhasse de relance, havia uns 10% de chance do Campbeltown ser confundido com um destróier alemão.

Não exatamente o USS Missouri…

Mesmo com as armas, o Campbeltown não teria esperanças de arranhar as comportas de 1500 toneladas, era preciso uma porrada bem maior, e isso era a função de um bloco de concreto envolvendo 4,5 toneladas de explosivos, no porão do navio. Ele deveria atingir os portões, se engastalhar nesse e então depois de um tempo, explodir.

Isso era parte da missão, também era preciso destruir as estações de bombas que enchiam e esvaziavam a doca seca. E os marinheiros precisavam ser protegidos para conseguir fugir. Essa missão impossível não poderia ser executada por soldados comuns, e como os ingleses não acreditavam em dopping, Steve Rogers foi rejeitado. Caiu tudo na mão dos Comandos.

Era uma idéia revolucionária para a época. O conceito de soldado ideal era um que cumprisse ordens sem questionar e não se aventurasse fora disso, havia um conjunto particular de habilidades que era exigido, mas mesmo que o soldado se destacasse em alguma, azar o dele. Já os Comandos eram o oposto disso tudo.

Eles eram uma tropa experimental formada por indivíduos rebeldes demais para se encaixar em tropas normais, todos eram excepcionalmente inteligentes, criativos e habilidosos. Os padrões de treinamento desenvolvidos pela tropa são os mesmos até hoje, eles costumavam treinar com roupa e equipamento completo de combate, e aprendiam de técnicas de sobrevivência a combate desarmado.

Os Comandos eram tão diferentes que nem tinham alojamentos, eles dormiam nas cidades próximas aos quartéis, para não perderem tempo com tarefas mundanas como cuidar da caserna.

265 Comandos foram selecionados para a missão. Quando o Tenente-Coronel Charles Newman explicou os detalhes dizendo que era uma missão 100% voluntária, e que ninguém que declinasse naquele momento sairia com qualquer mancha no currículo ou no caráter, nenhum dos 265 moveu um passo.

Nem mesmo o Amigo do Hitler, o Capitão Micky Burn, um sujeito que não teria lugar em nenhuma outra força armada do planeta, muito menos em uma missão como aquela.

Micky Burn, fazendo cosplay de francês

Michael Clive “Micky” Burn era filho de uma família rica e influente, mas seu período como estudante de Oxford não durou muito. Ele simplesmente se cansou das tarefas e exigências da vida universitária, sendo seduzido pela vida devassa e mundana da costa francesa. Mui adequadamente ele passou a ganhar dinheiro como escritor, essa raça degenerada.

Passando um tempo na Itália, ele se envolveu com várias beldades, inclusive Alice Keppel, ex-amante de Eduardo VII, mas seu caso mais notório foi com Guy Burgess, um sujeito que por algum motivo ninguém suspeitava que era gay:

Também ninguém desconfiou que ele fosse um espião soviético. Durante toda a 2a Guerra Mundial ele espionou para Stalin, tendo inclusive trabalhado na BBC e prestado serviços para o MI5 e o MI6, Burguess só desertou e fugiu para a União Soviética em 1951. É possível que Micky soubesse desse outro lado de seu amigo especial.

Não que ele se importasse, Micky era tão seguro de si que duas vezes, nos anos 1930 ele foi voluntariamente à polícia se entregar, anulando os efeitos de tentativas de chantagem que ameaçavam expor sua homossexualidade.

OK, tecnicamente ele era bissexual, mas o fato é que pra ser bi ou homo na Inglaterra dos Anos 30/40 o sujeito tinha que ser macho pra caramba.

Que Micky era decidido isso é fato, mas nem sempre suas decisões eram inteligentes. Ele se apaixonou pelo nacional-socialismo, acreditando que hitler havia recuperado a Alemanha economicamente, acabado com o desemprego e mostrado que o emprego liberta, como disse a tal moça. Micky acabou conhecendo Hitler pessoalmente, ficaram amigos e durante o famoso comício em Nuremberg, ele estava alguns metros atrás do Führer.

E você acha mico ter feito campanha pro Collor…

Nesse meio-tempo ele estava trabalhando como jornalista no Times, chegou a ser correspondente diplomático, e escrevia poesias. Aí em 1937 a ficha caiu, Micky viu que Hitler não era Führer que se cheire, e se alistou no exército. Com 25 anos ele já havia deixado para trás as ilusões de juventude, inclusive as “três autocracias com que flertou, Nacional-Socialismo Alemão, Comunismo e a Igreja Católica Romana”.

Servindo na Noruega, Micky chegou ao posto de Capitão, quando se voluntariou para fazer parte dos Comandos, onde sua personalidade forte e individualista achou um lar, e como não havia Bolsonaro nem Twitter, os Comandos ingleses e a sociedade como um todo eram extremamente acolhedores a comunistas nazistas gays católicos, obviamente.

Quem não foi muito acolhedor foi o povo em St Nazaire, e por povo em me refiro aos CINCO MIL soldados nazistas colocados lá para proteger o porto a doca e a base de submarinos.

Sim, eu sei, 265 Comandos versos 5000 soldados nazistas é uma luta injusta, total covardia mas não deu tempo dos alemães chamarem reforços, na noite do dia 28 de Março o destróier-bomba adentrou o estuário, chamando a atenção dos vigias nas margens, que começaram a abrir fogo. No navio o telegrafista começou a mandar sinais luminosos em morse, pedindo ajuda “Socorro, algum idiota está atirando na gente achando que somos inimigos!” e… funcionou!

Atrás 13 (ou 16 as fontes divergem) destas coisas, levando metade dos Comandos, que não couberam no destróier:

É uma lancha de patrulha de 100 toneladas, barata, de construção rápida e inadequada para ser usada no mar. Só servia para a Marinha Real dizer que tinha mais embarcações do que tinha de verdade. Seu casco era virtualmente impenetrável, feito de madeira de quase meia polegada, totalmente imune ao inimigo, exceto se usassem, como se chama mesmo? Balas.

Pra piorar algum gênio do Almirantado resolveu aumentar a autonomia das lanchas instalando dois tanques extras de combustível, do lado de fora, bem alto, com um total de 4500 litros de combustível, provavelmente marcados com um alvo e a inscrição schießen Sie hier.

Foi em uma dessas que Micky e seu pelotão chegaram na praia, sem tempo de se recuperar do enjôo. Nisso o bicho já estava pegando, os alemães atiravam feio desesperados e o timoneiro havia sido morto, em seu lugar o jovem engenheiro que desenhou a bomba pegou a roda do leme e guiou o navio em sua aproximação final.

Navegando nas águas escuras, no último momento um vigia alertou que estavam alinhados com o farol errado. Manobrando de forma brilhante o navio evitou o cais, e guinando bruscamente, embicou em direção às comportas. Ele as atingiu a 40Km/h, a proa subiu na estrutura de metal, posicionando a bomba precisamente. O detonador químico enquanto isso silenciosamente se preparava para a detonação, dali a umas duas horas. Cabia aos Comandos manter os alemães longe do navio.

Vários grupos se dividiram para as missões secundárias. Próximo dali havia a casa das bombas, que enchiam e esvaziavam a doca. O Capitão Donald William Roy, um escocês maluco que foi pra guerra usando um kilt e provavelmente gritando “só pode haver um!” enquanto brandia uma claymore liderou quatro homens nessa missão.

No meio do caminho ele foi ferido na perna no ombro e nas mãos, mas conseguiram instalar as bombas nas bombas. Só que estavam no fundo de uma estrutura com sete lances de escada, em escuridão total. O Capitão Roy, não querendo sacrificar seus homens, mandou que todos subissem, e depois que deu tempo de estarem em segurança, ele acionou o detonador de 90 segundos e tentou escapar.

Sem dar spoilers, Donald William Roy morreu em 31 de Dezembro de 1997.

Comandos explodiram dois rebocadores, danificaram subestações de energia e atacaram com morteiros e granadas posições de artilharia, mas uma hora eles perceberam que a fuga não seria mais possível. No mar a frota de lanchas estava sendo dizimada, por causa da até então desconhecida vulnerabilidade à balas da madeira de balsa.

Em terra a ordem era lutar até a munição acabar, e então tentar fugir para a Inglaterra. Na água, outra daquelas situações que seriam normalmente de extrema covardia: Uma das lanchas, a ML 306 estava sendo alvejada incessantemente, enquanto respondia fogo acertando alvos em terra. No comando de uma metralhadora Lewis um dos Comandos, o Sargento Thomas Durrant eliminou várias posições de metralhadoras e luzes de busca inimigas, quando chamaram a atenção do Jaguar, um barco torpedeiro com 10 vezes o deslocamento da ML 306.

Thomas Frank Durrant

A luta era desigual, mas a lancha não se rendia. O Sargento Durrant recebeu tiros na cabeça, braços, peito, estômago e continuou atirando, trocando os tambores de munição à medida em que os esgotava. O navio alemão sinalizava para que se rendessem, mas o fogo continuou até que os ferimentos finalmente impediram Durrand de continuar atirando. O barco foi abordado pelos alemães, que recolheram os sobreviventes, incluindo Durrand, já que a Morte pra levar um Comando tem que preencher toda uma papelada extra.

Ele só veio a morrer algumas horas depois, no hospital alemão em St Nazaire. Uma semana depois o já capturado Tenente-Coronel Newman, comandante da operação recebeu uma visita especial no campo de prisioneiros onde estava alojado: o Kapitänleutnant Friedrich-Karl Paul, comandante do Jaguar.

Ele fez questão de que o comandante inimigo soubesse os detalhes da batalha, de como o Sargento Durrant havia lutado com coragem e braveza. E mais, ele pediu ao Tenente-Coronel Newman que Durrant fosse indicado para alguma alta condecoração.

Isso em termos históricos é quase inédito, e a recomendação do oficial inimigo pesou para que Durrant recebesse postumamente a Victoria Cross, a mais alta condecoração militar do Império Britânico.

Nosso amigo Micky Burns enquanto isso enfrentava fogo pesado, sendo ferido logo ao chegar em terra. De seu grupo de 29 homens 14 haviam sido mortos, ele combateu por mais um tempo, até ser capturado.

Na manhã seguinte ele e outros prisioneiros foram levados para a doca, onde tiveram que provar que além de Comandos, eram excelentes atores. O HMS Campbeltown ainda não havia explodido, e os alemães não estavam com pressa de tirar os prisioneiros dali.

Sem esboçar qualquer reação Micky ficou tranquilo ao lado da bomba, para não alertar os alemães de que havia uma surpresa pra eles.

Logo os prisioneiros foram levados dali, e os alemães inspecionaram o navio, tiraram fotos, oficiais subiram e posaram, felizes de terem repelido o ataque inimigo, e bastaria um rebocador arrancar o Campbeltown dali, dar uma demão de zarcão na comporta, e back to business.

Logo depois que os prisioneiros foram embora a bomba explodiu. A confusão foi tão grande que tropas francesas leais ao Reich que vieram ajudar foram metralhadas pelos alemães, que as confundiram com mais um ataque dos Comandos.

Hitler ficou tão puto que qualquer Comando capturado dali em diante seria fuzilado como espião, mas o mal já estava feito. A doca, inundada e com os restos do Campbeltown presos ao que restou das comportas, só foi reparada em 1947, quando acharam no fundo dela os restos de um destróier alemão destruído durante o cataclisma.

O Tirpitz, sem uma base para reparos nunca saiu para o Atlântico, ficando nos fiordes noruegueses até ser afundado em 12 de Novembro de 1944. Em toda sua carreira ele não afundou nenhum navio aliado.

O custo da Operação Chariot, como foi chamado o ataque em St Nazaire foi altíssimo. Dos 622 homens só 228 conseguiram retornar para a Inglaterra. 169 (105 marinheiros e 64 comandos) foram mortos, o resto foi feito prisioneiro.

Micky Burn foi mandado para vários campos de prisioneiros, mas como ele começava a ensinar coisas perigosas aos colegas, acabou sendo transferido para o Castelo Colditz, onde os alemães mantinham seus prisioneiros VIP. Lá ele ajudou a transcrever as transmissões do rádio ilegal, escreveu reportagens que mais tarde enviou para o Times, e conseguiu até produzir um livro inteiro, a novela Yes, Farewell.

Ele costumava receber pacotes da Cruz Vermelha, enviados por uma velha amiga, Ella Van Heemstra, uma aristocrata holandesa. Quando a guerra acabou e a situação no pós-guerra não ficou nada fácil, os papéis se inverteram, Micky enviava para a amiga pacotes com comida e cigarros, com isso ela conseguia não passar fome, e vendia os cigarros para comprar Penicilina e tratar a filha doente.

Micky Burns havia salvo a vida de Audrey Hepburn.

Ele se casou em 1947 com Mary Booker, e ficaram juntos até ela morrer em 1974. Ex-gay com certeza não há, mas ex-bi pelo visto existe ;)

Micky continuou se dedicando à poesia, literatura e sua memórias, trabalhando como escritor até 2006. Ele faleceu de causas naturais em 3 de Setembro de 2010, aos 97 anos. Uma pena, adoraria ver sua reação quando um millenial dissesse que ele era uma minoria oprimida.



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