O Invasor Sombrio: o espião alemão que tocou terror nos EUA

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No meio do Atlântico um dispositivo maligno, pacientemente consumindo seu estopim, é finalmente acionado. Uma detonação deflagra o resto da carga do navio: milhares de toneladas de munição e suprimentos dos Estados Unidos para a Inglaterra. É o auge da Primeira Guerra Mundial, e em seu escritório em Manhattan o Capitão Franz von Rintelen faz a Pirâmide de dedos de maligna contemplação e diz “Excelente!”

OK, talvez ele não tenha feito nenhum gesto tão melodramático, mas era de seu direito. Von Rintelen foi o mais bem-sucedido espião alemão nos EUA durante a Primeira Guerra Mundial, atingindo status de supervilão.

Filho de banqueiros, Rintelen teve excelente educação, falava inglês muito bem e logo chamou a atenção da marinha alemã, tornando-se oficial de inteligência. Com a patente de capitão, foi enviado para os Estados Unidos, com um passaporte falso da Suíça. O objetivo era montar uma rede de espionagem.

Em 1915, quando ele chegou, os EUA ainda eram neutros, em teoria eles forneciam armas e suprimentos para os dois lados, mas como os ingleses controlavam o Atlântico, somente navios deles conseguiam atravessar. Isso era ruim para a Alemanha.

Cheio de contatos com o mundo empresarial, Rintelen logo montou uma série de empresas e iniciativas, tudo fachada, bancado por verbas bem generosas vindas direto do Almirantado.

Ele conseguiu contatar um tal de  Walter Scheel, um químico (nunca confie nesses caras) que desenvolveu uma série de dispositivos incendiários, as chamadas “bombas-charuto”, que eram escondidas entre a carga nos navios, e depois de vários dias, explodiam.

Como bom vilão, Rintelen não era 100% malvado. Um dia ele descobriu que os estivadores que tinha contratado para instalar bombas em cargueiros levando munição haviam tentado sabotar também navios de passageiros. Ele demitiu todo mundo e arrumou novos capangas.

Ele também usou muito dinheiro fundando e financiando o Labor’s National Peace Council, uma “ONG” que, ironicamente, defendia a Paz e organizava sindicatos para protestar contra o uso de trabalhadores americanos para ajudar a Guerra na Europa.

A idéia era promover greves, manifestações pela paz e isolacionismo.

Ele quase conseguiu fazer com que o México entrasse em guerra com os Estados Unidos, ao mesmo tempo, tentou financiar um golpe de Estado para reinstituir Victoriano Huerta, ditador deposto.

Em 30 de julho de 1916 Rintelen conseguiu um de seus maiores feitos, embora até hoje não haja prova concreta de seu envolvimento: A Explosão Black Tom, quando via sabotagem os depósitos de munição na ilha Black Tom, perto da Estátua da Liberdade, foram explodidos.

910 toneladas de munição de artilharia e armas leves, 45 toneladas de TNT, tudo foi pelos ares. 50 pessoas morreram em uma das maiores detonações não-nucleares da história, acumulando um prejuízo de US$560 milhões, em valores de 2024.

Outros atos de Rintelen foram menos dramáticos, mas também eficazes. Através de suas empresas, ele comprou grande quantidade de pólvora via uma corporação fantasma, que era depois destruída. O objetivo era criar escassez e atrapalhar a vida dos países europeus que dependiam dessa munição.

Depois de um tempo, ele teve uma idéia melhor ainda: criando várias empresas no ramo de armamento e munição, ele começou a oferecer serviços para os europeus; como nesse ramo as encomendas demoram quase tanto quanto as entregues pelos Correios, havia tempo suficiente; ele vendia milhares de toneladas de munição para os europeus, recebia um sinal generoso, e prometia entrega em seis meses.

Seis meses depois, nada era entregue, Rintelen havia embolsado o dinheiro, e não havia mais sinal da existência das empresas de fachada.

Ele chegou até a tentar comprar a DuPont, mas não conseguiu.

O estilo de Rintelen não era bem-visto pelos espiões mais convencionais, e ele sofria inveja e olho-gordo direto, o que foi sua derrota. Um dia Franz von Papen, adido militar e também espião mandou um telegrama para Berlim reclamando de Rintelen, só que ele usou uma cifra que os americanos conseguiam decifrar.

Depois disso Rintelen foi chamado de volta para a Alemanha. No caminho de volta seu navio foi desviado para a Inglaterra. Depois de bastante tempo sendo interrogado, ele admitiu que sua identidade suíça era falsa, e passou 22 meses numa prisão britânica.

Extraditado para os EUA, ele foi julgado e condenado, mas sabe-se lá o motivo, talvez dinheiro (provavelmente dinheiro) ele só pegou 3 anos, sendo solto e voltando pra Alemanha em 1920.

Não exatamente um bom lugar, ele viu um país devastado pela Guerra, humilhado pelo Tratado de Versalhes, e mais ainda, ele viu um sujeito com um bigode ridículo começar a se tornar popular, com soluções fáceis e bodes expiatórios para os problemas que a própria Alemanha havia causado.

Rintelen simplesmente odiou Hitler, de cara. Quando o baixinho se tornou Chanceler, em 1933, Rintelen se mudou para a Inglaterra. Com o começo da Guerra, ele procurou o SOE, o grupamento de forças especiais das forças armadas, e ensinou a eles tudo que sabia sobre dispositivos explosivos.

Von Rintelen, o maior espião alemão, morreu em 1949, depois de ajudar seu maior inimigo a derrotar um Mal Maior. O que nos leva a concluir que nem todo alemão é alemão.

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