Como Linus roubou o código do Windows e outras maravilhas do jornalismo especializado

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Segundo o IDG Linus Torvalds, basicamente roubou o código-fonte do Windows para fazer o Linux. Sério, vejam a afirmação, neste artigo deles, descoberto pelo BR-Linux:

Se Linus Torvalds não experimentasse o código fonte do Windows e o tivesse personalizado como quis, ele talvez nunca tivesse criado o kernel Linux.

Chocante, não?

Não. É só mais um erro besta de tradução. O estagiário que traduz artigos da PC World para publicação na versão nacional fez o melhor que conseguiu. Estagiários mal são formas de vida, é compreensível.

O que não é compreensível é esse tipo de erro -comum- passar batido. A culpa é de uma aberração no Brasil (e em parte no Mundo) – o jornalismo especializado por delegação. O sujeito raramente tem uma graduação na área (não que eu defenda isso como obrigatório), ou sequer é fã, interessado, usuário. Normalmente surge a idéia de fazer uma coluna sobre tecnologia, escolhem quem está mais folgado e delegam. “Agora você cuida da informática, Zé”.

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Funcionava em outros tempos, em outras áreas. Jornalismo “científico” em mídias não-especializadas por exemplo sempre foi simples; você adapta um press release que já vem mastigado, simplifica mais um pouquinho e toca pra frente. Vejam um exemplo: Um grupo de cientistas descobriu um microorganismo que processa luz como parte de seu metabolismo, de uma forma completamente nova. Organismos que utilizam luz como energia não são novidade, chamam-se PLANTAS, mas 98% dos jornalistas do planeta esqueceram disso, e todos os sites estrangeiros publicaram a mesma manchete: “Descoberto organismo que converte luz em energia”. Inexato, cômico e objeto de comentários sarcásticos de todo mundo que teve aula de ciências no 1º Grau. Bastaria mudar para “Organismo descoberto converte luz em energia de forma até então desconhecida”.

Na matéria do ladrãozinho finlandês que surrupiou a Microsoft, se o responsável fosse além de um editor, chefe de redação, jornalista, se ele fosse fã de tecnologia e informática ele não deixaria passar. Qualquer um que acompanhe a área sabe que o Linus NUNCA “experimentou o código-fonte do Windows”. Alarmes soariam em sua cabeça na hora dizendo “tem algo muito errado aqui!” (na cabeça do editor, se bem que provavelmente na do Linus também, se visse os fontes citados)

Escrever sobre tecnologia, especialmente em veículos especializados exige muito mais do que capacidade de síntese. Todos os jornalistas sérios que já me entrevistaram pediram “me explique o que é esse negócio”, em geral interrompendo para perguntas, até realmente entenderem. Só depois que a entrevista em si era iniciada. Para escrever bem sobre algo, mais do que conhecer o assunto, é preciso saber o que você não sabe. Até que ponto pode ir, e se sua visão não está limitada por essa falta de conhecimento.

Escrever sem conhecimento, sem afinidade por um tema coloca o redator do texto em posição de inferioridade diante dos que efetivamente vivem e gostam do tema em questão. Uma vez surpreendi um grupo de executivos da Microsoft com a notícia de que a empresa já havia vendido um sistema operacional Unix. Entre todos ali era eu quem conhecia mais da história da empresa. Steve Ballmer não cometeria uma gafe dessas. Motivo? Paixão. Ele realmente gosta do que faz e conhece cada detalhe da empresa.

Um jornalista de tecnologia que não gosta de tecnologia, que é só um jornalista fazendo um trabalho vai cometer erros como o do IDG. É inevitável. Enquanto os profissionais não forem escolhidos por critérios mais subjetivos do que experiência em carteira, idade e cargos exercidos, teremos esses exemplos, onde profissionais que funcionariam muito bem em uma redação genérica viram motivo de piada escrevendo na mídia especializada.

Por essas e outras que blogs cada vez ganham mais espaço. Em geral escrevemos sobre assuntos que dominamos, ou pelo menos gostamos. Damos opiniões (o que parece ofender muita gente, curiosamente), o que é diferente de noticiar informação não-confirmada como Verdade Absoluta. (não, não é merchandising do Melo)

O “patrulhamento” dos leitores é extremamente positivo, no nosso caso. Quando não é feito por pura implicância e trollismo, complementa, corrige e expande a informação original. Muitas vezes muda-se de opinião, por causa do que é adicionado pelos comentaristas.

Só que não é todo blog que cresce e vira referência. Os que só fazem reblog, não acrescentam nenhum toque pessoal, tendem a ter pouca ou nenhuma fidelidade. Mesmo que tenham audiência, esta é volátil. Um dos conselhos que mais ofereço a quem está começando é: Escreva. Escreva muito. Se for fazer reblog, cite 10 linhas da notícia e escreva 20 com sua opinião sobre o assunto. Pronto, acabou o reblog. Se você não tem capacidade de escrever 20 linhas sobre um assunto, ou “não tem tempo”, como um plagiador já disse, se defendendo, não faça blogs. Só vai ficar frustrado quando não tiver visitas, links ou comentários. Não é vergonha, você não é OBRIGADO a saber escrever. Eu não sei dançar, e sou incapaz de tocar qualquer instrumento musical. Desafino até tocando meu iPod. Conheço gente que toca piano bêbada como um gambá. Vou insistir pra quê? Sei meus limites. Não me considero inferior por ser 100 vezes pior com uma flauta doce do que uma bióloga bêbada com a camisa do avesso (longa história) reclamando que o teclado tem poucas oitavas, e improvisando mesmo assim. Quer dizer, sou inferior SIM, reconheço. Mas alguma coisa eu devo fazer bem. Me focar na música, como muitos se focam em blogs, é jogar contra si mesmo.

Um blog TEM que ser mais interessante que suas fontes, TEM que acrescentar algo. do contrário um belo dia seus leitores vão assinar os mesmos feeds que você, pegarão as notícias direto na fonte e você terá se tornado irrelevante como um jornalista especializado que não gosta de sua especialidade.


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