A arma secreta que todo soldado levou na Invasão da Normandia

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Existem muitas bobagens sobre guerra que as pessoas adoram repetir, tipo Hitler invadiu a Rússia no inverno. Eu admito que dependendo do ponto de vista o Führer pode ter uma ou outra falha de caráter, e estrategicamente sua visão ela limitada, mas a Operação Barbarossa começou em Junho de 1941, em pleno verão. Hitler não tem culpa se os russos não colaboraram, pô.

Outra imensa bobagem é que militares querem soldados burros, autômatos que obedecem ordens sem questionar. Isso foi tentado diversas vezes, e ainda é padrão em lugares como China e Melhor Coréia, aonde há bucha de canhão suficiente para vencer apenas com o mérito de número superior, mas outras forças dependem de inteligência, astúcia e iniciativa, do mais condecorado general ao mais humilde soldado. Lembrem-se da frase de George Patton:

“Nenhum bastardo jamais ganhou uma guerra morrendo por seu país. Ele ganhou fazendo outro pobre bastardo morrer pelo pais dele”.

O ethos (nosso como eu sou intelectual) do soldado americano é o indivíduo, ele nunca foi vendido como uma força anônima e monolítica, isso se reflete nos cuidados individuais, vide os esforços para dar sorvete aos soldados.

Cuidar dos soldados não significa só dar a ele as melhores armas produzidas pela empresa que ofereceu o menor valor na licitação, era preciso armar os soldados para combater um inimigo maior do que os alemães: O tédio.

Ao contrário do que os filmes mostram, o que um soldado mais faz em tempo de guerra é esperar. São longas horas, dias, às vezes semanas sem nada para fazer além das tarefas diárias de manutenção. Confinados em campos, sem poder sair e sem nem um barril pra se aliviar, visto que a Marinha monopolizava os barris.

Como um Walkman na época provavelmente ocupava um andar inteiro e de qualquer jeito estavam em guerra com o Japão, a alternativa eram os livros, e um grupo de bibliotecas organizou a Victory Book Campaign, coletando doações de livros para os soldados. A campanha surgiu depois que a idéia do chefe da Biblioteca do Exército, Raymond L. Trautman, não deu certo.

Ele queria comprar um livro para cada soldado, mas a verba obviamente não existia. O jeito foi apelar para as doações, que arrecadaram um milhão de livros no primeiro mês, mas também não deram muito certo. Muitos dos livros doados eram subversivos, de sacanagem ou não se encaixavam no que o Exército achava apropriado para os soldados.

A falta de padronização, tamanho e peso excessivos também tornavam os livros incômodos, e nunca havia número suficiente de títulos populares. Isso durou até 1943, quando uma ONG, o Council on Books in Wartime apresentou uma solução.

When Books Went to War cover.

O CWB era formado por editoras, autores, críticos, jornais, etc. Seu objetivo era manter a moral do povo em alta, evitando que os EUA perdessem a iniciativa durante a guerra. Eles fomentavam a publicação de livros de ficção e técnicos, mas também se preocupavam com os soldados, e em 1943 apresentaram uma proposta pra lá de ousada:

Formariam um comitê que se reuniria duas vezes por semana, selecionando títulos, entre livros clássicos e modernos, que seriam rapidamente editados na forma de pocket books, e vendidos para o Governo ao preço de US$0,89 por unidade, em valores atuais.

Como o CBW englobava as próprias editoras, toda a burocracia de direitos autorais foi facilmente negociada, e uma das exigências era que os livros não seriam vendidos no território americano. O resultado foi uma enxurrada de edições:

As chamadas Armed Services Editions fizeram um sucesso absurdo, pois não eram propaganda pura como os jornais oficiais ou as rádios, nem sofriam censura direta. Sim, havia uma série de diretrizes, como não promover comunismo, histórias aonde os soldados eram os vilões e sacanagem excessiva, mas fora isso o CBW tinha liberdade total para escolher os títulos.

As histórias publicadas iam de Charles Dickens a H.G. Wells, G. K. Chesterton, Homero, Jack London e muitos outros.

Essas edições eram adoradas pelos soldados. As setenta editoras e 19 gráficas não davam conta, publicavam um novo título a cada dia, entre 1943 e 1947, quando o programa foi encerrado, foram publicados 1322 títulos, em um total de 122.951.031 livros impressos.

Eles eram distribuídos não só em hospitais e quartéis, mas até em suprimentos de emergência lançados de paraquedas para tropas sitiadas pelo inimigo. Os soldados chegavam a rasgar os livros ao meio, separando-os em duas partes para poderem ler mais títulos de cada vez.

Quando a força expedicionária desembarcou na Normandia, quase todos reclamaram do excesso de peso em seus kits de combate, mas nenhum reclamou de um item que havia sido fornecido e recebido com gratidão: um livro.

Quando todos esses soldados habituados com a leitura voltaram para suas vidas na América. Ao mesmo tempo foi instituído o Servicemen’s Readjustment Act of 1944, uma legislação com uma série de benefícios para veteranos, incluindo bolsas de estudo para cursos profissionalizantes e universidades. Estima-se que por voltade 1956 7.8 milhões de veteranos tenham utilizado os benefícios, se formando em faculdades que jamais teriam condições de cursar normalmente, e terminando seus cursos com muito mais facilidade, dada sua familiaridade com o hábito da leitura.

Um país pode se preparar para uma guerra, mas somente uma Nação prepara seus soldados não só para combater, mas para vencer na vida como cidadãos.



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