Pior que o Bobo do Bolsonaro são os bobões que tem medo dele.

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Existe um paradoxo que sempre me diverte, e vem do problema de qualificar os inimigos. Tom Clancy sempre deixou claro em seus livros que os russos eram os inimigos, mas eles sempre foram, se não temidos, respeitados.

A regra é bem simples: Se seu inimigo é um idiota completo, incapaz de ter um pensamento original, manipulado por todo mundo e com idéias simplórias, como ter medo dele? Como justificar suas derrotas?

Por anos a Direita no Brasil tomou na cabeça por reforçar a imagem de que Lula era analfabeto, incompetente, burro, um peão simplório em um partido de peões simplórios. Isso ajudou a ocultar um dos maiores e mais sofisticados esquemas de corrupção de todos os tempos, e o peão simplório era um mestre da articulação política, algo que ficou mais evidente ainda quando a Dilma mostrou que não conseguia conversar civilizadamente o suficiente pra se manter no poder.

A esquerda por sua vez adora o discurso de que estamos a um passo do fascismo, sem perceber que está propondo fascismo como solução para o fascismo. Ainda não consegui engolir que tive que acabar com uma amizade que me era cara, quando minha amiga, em seu afã de proteger o país dos terríveis fascistas disse que queria ter um jeito de identificar na rua os eleitores do Bolsonaro, para assim não ter que interagir com esse tipo de gente.

Uma forma de identificar um grupo específico de indesejáveis na rua. Aonde eu vi isso antes? Ah sim.

O fato dessa ex-amiga ser judia só mostra que não aprendemos porra nenhuma com a História, mas eu divago.

A polêmica do dia é por causa disto:

Basicamente durante uma das mini-coletivos que o Ornitomito faz todos os dias ele levou junto o Carioca do Pânico, para imitá-lo. Uma bobagem? Com certeza, mas a mídia militante está ofendidíssima.

Consideram um desrespeito, motivo pra impeachment, etc, etc. A Narrativa predominante é que isso é uma forma de distrair todo mundo, para que o Presidente não tenha que comentar sobre os péssimos resultados do PIB.

Sendo que quando o Presidente não quer comentar sobre algo ele xinga uma repórter ou simplesmente muda de assunto, diz que não tem tempo, etc. Bolsonaro, como todo político, sabe muito bem como desviar de perguntas da imprensa.

O que mais ofendeu a Imprensa não foi não ter suas perguntas respondidas, foi o Presidente levar um HUMORISTA para o ambiente litúrgico de uma Coletiva. Isso não se faz, jornalismo é coisa séria.

Esse é o problema. O Brasil é o país cheio de coisas sérias, cheio de coisas com as quais não devemos brincar. Fantasia de índio? Não pode. Piada de padre? Não dá. Zoar um político? Só se for do outro partido e mesmo assim, com limites.

O brasileiro adora pagar de bem-humorado, de povo alegre e descontraído, mas a primeira brincadeira que toque em um nervo exposto, é caso de polícia. E não, não estou restringindo isso aos lacradores problematizadores. Isso vale pra TODO MUNDO. Acha que estou exagerando? Lembra da Enfermeira dos Animaniacs?

Sim, o bom e velho fetiche da enfermeira sexy, algo inofensivo a ponto de ser usado em desenho infantil, pois adultos sabem diferenciar sacanagem de realidade, certo?

Veja então como o afegão, digo brasileiro médio liga com isso:

Mais de 15 ações na Justiça de órgãos de classe, exigindo indenizações e -pior ainda- censura. A Enfermeira do Funk? Rodou. Strip-tease do Superpop com enfermeiras? CENSURADO. Enquanto todo mundo se preocupa com o fascismo do Bolsonaro, ninguém enxerga o mutirão de ofendidos profissionais.

O Edson Aran costuma dizer que não existe humor a favor, quando existe é uma vergonha, e eu concordo, mas como sempre, há nuances, e o brasileiro não sabe trabalhar com nuance.

O Carioca fez uma caricatura sem dentes, digna do Humor do Bem do Legendários, fosse sobre qualquer outro político, seria aplaudido pela turma do politicamente correto. A culpa disso é do Bolsonaro, que como todo político brasileiro não sabe rir de si mesmo.

Quando o político consegue isso, mesmo o Humor a Favor se salva. Mas para isso é preciso ter a cultura de não se levar tanto a sério, de saber separar a liturgia do cargo da pessoa. Quando isso acontece temos algo como o Jantar dos Correspondentes de Imprensa da Casa Branca, algo que simplesmente NUNCA acontecerá no Brasil.

Imagine a cena: O Presidente se reúne num jantar com um monte de jornalistas, empresários do ramo, figuras famosas e… humoristas. Ele então não só é zoado por um humorista convidado, como também faz uma apresentação de stand up.

Em uma das apresentações, ainda no tempo do Obama, ele encenou um discurso com o Keegan Michael-Keel, da popularíssima dupla Keel and Peele. No quadro do programa original Keel é Luther, o Tradutor de Raiva do Obama. Peele faz o Presidente, e Keel diz o que ele realmente quer dizer. Isso ao vivo com Obama foi… hilário.

A culpa, claro, é do texto, que não fala como Obama é o máximo e todo mundo deve bater palmas pra ele. O texto é bem mais inteligente que isso.

Antes que alguém fale, isso não é exclusividade dos presidentes democratas. Lembra do George Bush, que era satã em pessoa e iria destruir o mundo? Pois é, em 2006 ele fez a mesma coisa que o Ornitomito, com um imitador falando “a real” e se autozando:

Essa capacidade de rir de si mesmo, inexistente na maioria dos brasileiros motiva coisas como as críticas da esquerda ao Militante Revoltado do Marcelo Adnet, mas pode ser pior ainda.

Quando um Presidente não é reeleito, ele é chamado de Lame Duck, Pato Manco, e o período entre a eleição e a posse é considerado tempo irrelevante, ele não pode aprovar nada, propor qualquer grande mudança sem a concordância do adversário vencedor.

O resultado foi que na saída de Bill Clinton ele apresentou no Jantar dos Correspondentes de Imprensa da Casa Branca o delicioso vídeo abaixo, aonde ninguém dava mais bola pra ele:

No Brasil é virtualmente impossível um candidato a cargo majoritário ir a um programa de humor. O medo de ser zoado é grande demais. Não aceitamos a crítica vestida de brincadeira. Ela tem que ser inofensiva.

Eu imagino como seria no Brasil algo como o Jantar Al Smith, um evento promovido pela Igreja Católica em New York, aonde um monte de gente paga caro (os ingressos vão para a Caridade) para jantar com os candidatos majoritários à Presidência, que tradicionalmente em seus discursos zoam um ao outro.

Isso mesmo que você está vendo: Hillary Clinton e Donald Trump se zoando e rindo das espetadas.

Rir de si mesmo é essencial, e seria a melhor forma de “derrotar” o Bolsonaro. Ao invés de se indignar, de reclamar da falta de seriedade numa mini-coletiva informal no começo do dia no meio da rua, que tal abraçar a zoeira?

Diariamente vejo jornalistas arriscando a vida na Rússia, Venezuela, Síria. Jornalistas enfrentam governos autoritários de verdade, assassinatos, rebeldes com AK-47s, ameaças de traficantes mexicanos e chefes de Estado.

Eu sinto pena de quem se deixa intimidar por um humorista do Pânico. No mínimo eu apareceria para entrevistar o Bolsonaro vestido de Freddie Mercury Prateado. Mas isso não vai acontecer, jornalismo é coisa séria.



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