Eu já falei de quando entrei em um quadro de depressão sério, ao trabalhar em um sindicato da CUT e só ver notícias publicadas pelo jornal interno. Tive a certeza de que o mundo ia acabar, era tudo uma bosta, nada valia à pena. Foi uma senhora bolha, mas já estive em várias. Por um tempo eu achei que era o pior escritor do mundo. Todo o feedback que recebia era por cartas ou emails para a editora, e eles só me repassavam as reclamações. leitor que não entendeu o texto, gente que achou complicado, gente que achou simples. Só me salvou ter um ego de proporções galácticas e decidir que eu estava certo e todos errados.
Bolhas, ou zonas de conforto são um problema pra todo mundo, mas a Internet transformou isso em uma instituição, e há um enorme perigo nessas imensas câmaras de eco que arregimentam militantes alegres em encontrar seu espaço seguro.
Óbvio que é bom você discutir seus assuntos com gente que tem as mesmas afinidades, é pra isso que inventaram times de futebol, bar com os amigos, religiões e clubes de sadomasoquismo, mas o perigo é a perda de perspectiva. No DA da UFF, que eu frequentava basicamente porque queria pegar a doce e meiga Thaisinha (spoiler, não peguei) havia um clima de revolução sexta-feira se não chover onde o Presidente da República estava prestes a cair. A Revolução Socialista era inevitável e iminente, e se isso te lembra aqueles crentes que anunciam o fim do mundo toda semana, são basicamente iguais.
Hoje os militantes se fecham em páginas do Facebook, grupos do Whatsapp e similares, se distanciando do mundo real E principalmente de suas causas. Ao invés de promover idéias, a maior parte do tempo ficam caçando inimigos, reais ou imaginários, de preferência imaginários. Os grupos GLS, pra usar a sigla de raiz, são os maiores contraventores nesse quesito.
Vamos a dois exemplos: No seriado Flash, da CW O Capitão David Singh é o chefe de Barry Allen.
Ele é durão, competente, típico tira de TV. (alguém usa a gíria “tira” fora da tv?) é de descendência indiana (yay minorias) e… gay. Sim, querida cria dos Anos 80, eu já pensei em todas as piadas possíveis envolvendo o Capitão Gay, relaxa.
Singh seria o típico personagem lacrador, se ele não fosse tratado como um personagem real, não uma bandeira. Ele é gay como pessoas reais são gays. É só mais uma faceta da vida do sujeito, ele não fica jogando isso aos quatro ventos, é mostrado como natural e cotidiano, como quando ele reclama que o namorado entrou numa vibe saudável e ele só consegue comer porcaria na rua. No episódio em que Rob, o namorado é sequestrado por um vilão os fãs se preocupam realmente com ele, pois interesse amoroso de coadjuvante em seriado é sempre bucha de canhão.
Em Arrow o Mr Terrific também é gay.
Ele decidiu voltar aos treinos (foi atleta quando mais jovem) depois de ter sido espancado na rua. É um gênio da tecnologia e se separou depois que o marido não conseguiu aceitar que ele tinha que ficar até tarde no trabalho. Sim, gays também sabem ser mulheres chatas, igualzinho a homens héteros ciumentos. Curtis é um ótimo personagem, ele evoluiu na série e se tornou regular, por puro mérito dos roteiristas e do ator.
Você não viu algum site de lacração falar deles, certo? Não falam, exemplos positivos não contam. A Câmara de Eco só ecoa coisa ruim, e sem o feedback do mundo real, se afastam mais e mais, com desculpas de inclusão e representatividade.
Isso é evidenciado pelas siglas. Antigamente era GLS, que meu eu pré-adolescente entendia como Gay, Lésbica e Sapatão, mas era S de Simpatizantes. Aí perceberam que faltavam os bissexuais e os trans, virou LGBT, e por muito tempo funcionou perfeitamente, exceto nos grupos isolados mais radicais dos DCEs, que com a Internet começaram a se comunicar, criando câmaras de eco remotas.
Se EU sou tarado por mulheres de narizes grandes não falo isso pra ninguém. Se eu descubro que há um grupo com centenas de tarados iguais espalhados pelo mundo, me sinto seguro para tornar esse fetiche público, mas isso não o faz menos esquisito e menos raro. Da mesma forma só porque um monte de idiotas se identifica como “Two Spirit”, não quer dizer que seja um gênero real, é apenas a Internet amplificando a necessidade de se sentirem floquinhos especiais e não se dizerem bissexuais como pessoas saudáveis e sãs que gostam de meninas e meninos.
Com o tempo a necessidade de ser único e especial levou à criação de mais e mais identidades, transformando a questão de gênero em uma piada de mau gosto. Você acha que eu inventei os LGBTs do título? Clique, cada um está linkado para uma fonte.
Como diria Steve Rogers, posso fazer isso o dia inteiro, a lista de siglas é quase tão grande quanto a lista de gêneros. Que falta de imaginação do Ney Matogrosso ao cantar “Sou masculino e feminino”.
Esse tipo de coisa funciona perfeitamente na bolha, mas só na bolha específica. Mesmo entre a militância não há consenso se o correto é LGBTQQIAAP ou LGBTIQCAPGNGFNBA, é uma terminologia inviável para uso em condições reais. Você consegue imaginar alguém tendo que se lembrar dessas grafias, e fazendo uso diário? Veja um exemplo dessa insanidade vazando pro mundo real:
Parou de rir? Eu espero.
Eu sei, uma sigla que precisa ser explicada é inútil, e há um problema mais grave, que aparece mais nas linguagens “inclusivas” de neutralização de gênero, criadas por gente idiota que não sabe que o gênero neutro em português é idêntico ao masculino, por isso nós falamos “O” topete e “A” baguete.
Vemos em um monte de lugares bobagens como “Alunxs” (“estudantes” é sinônimo e sinônimo não lacra), “amigxs”, “professorxs” e similares. A grande pergunta é “COMO SE PRONUNCIA ISSO, FILHO DE UMA CADELA ROMULANA?” Até hoje ninguém respondeu. Sabe porquê? PORQUE NÃO IMPORTA.
Essas atitudes lacradoras, seja neutralizar gênero, seja inventar acrônimos enormes e inclusivos são feitas apenas para sinalizar virtude, mostrar como VOCÊ é o iluminadão progressista defensor das minorias capitão gay! (eu não consigo esquecer do Singh)
Não é algo feito para conscientizar o grande público, não é algo criado com intuito de esclarecer, não há interesse na militância radical em criar qualquer tipo de simpatia. Só interessa o conflito, pois assim podem manter seu status imaginário de vítimas sofredoras, sendo que a população LGBT que sofre mesmo tem mais com que se preocupar do que se ofender com um “Senhoras e senhores” na abertura de um discurso não ser “inclusivo”.
O fenômeno aqui é a criação de um dialeto que não funciona como linguagem falada. Isso em termos de linguística é uma aberração. É pior que esperanto. São pessoas que voluntariamente ignoram o contato humano direto, se sentem confortável com uma forma de comunicação que só funciona através de textos. Elas estão se isolando do mundo real e mesmo de seus pares.
Faça a experiência. Quando alguém enfiar um “pessoes”, “programadorxs” numa mensagem, pergunte como se pronuncia isso no mundo real. Aposto que vai receber como resposta o silêncio, ou justificarão que “é algo para ser usado na Internet”, o que faz tanto sentido quanto dizer que brancos são proibidos de falar “nigger” mas escrever, tudo bem.
Essa situação toda me assusta, pois as causas são justas sérias e urgentes, mas a militância se afasta cada vez mais de qualquer preocupação real. Um post de problematização gera todos os cliques e pontos de internet que um militante precisa pra ser feliz, é muito mais prático do que gerenciar um fórum de apoio a jovens LGBT.
Principalmente, ninguém jamais será criticado por bater o gato no teclado até criar a sigla LGGBDTTTIQQAAPP. Dentro da movimento há imunidade, todos acham lindo fofinho e inclusivo. Fora do movimento, não importa pois todos são reaças conservadores homotransqueerfóbicos. Também não importa que isso transforme a causa em uma piada e na pior das hipóteses gere uma imensa antipatia de quem está de fora. Essa antipatia não atinge a militância em seus Espaços Seguros, no máximo tornarão mais difícil a vida do pessoal LGBT que vive no mundo real, mas aí não é problema deles.
Parabéns aos envolvidos.