SS Stephen Hopkins, o cargueiro guerreiro

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O SS Stephen Hopkins foi uma pedra no sapato de Hitler. Uma ferramenta fundamental para impedir o melhor plano nazista para colocar a Inglaterra, e conseqüentemente a Europa de joelhos.

O Reino Unido não tinha uma grande produção industrial, e também carecia de matérias-primas. Quando se é um império e está em paz, tranqüilo trazer material das colônias, mas se a guerra explode, suas colônias são atacadas e você perde seus fornecedores, o cinto começa a apertar.

Os alemães planejaram exatamente isso, atacar os navios cargueiros levando suprimentos para os ingleses. Mais tarde, quando os ingleses começaram a andar em comboios com navios de guerra como escolta, os nazistas lançaram operações coordenadas com matilhas de até 50 submarinos.

Um comboio aliado em Casablanca.

Os ingleses sabiam que as perdas seriam brutais, e encomendaram aos Estados Unidos navios de reposição, em um programa que começou a crescer em 1940, no período que os alemães chamaram de Tempos Felizes, quando 282 navios aliados foram afundados, mandando para o fundo do mar 1.48 milhões de toneladas de carga e boa parte dos tripulantes.

O conceito dos navios Liberty era serem de produção extremamente barata, e vida curta. O planejamento era que durassem cinco anos. O preço era equivalente a US$31 milhões em 2021, o que é caro para um fim de semana em Iguaba, mas bem barato para um navio.

Para economizar, os navios eram movidos a carvão, que já era considerado obsoleto na época, mas era abundante e barato no Reino Unido. A especificação e os planos foram enviados pelos ingleses, e modificados pelos americanos.

No auge da produção os Estados Unidos tinham 18 estaleiros produzindo navios Liberty. Com o tempo eles conseguiam um tempo médio de construção de 40 dias. Com 20 o navio já estava no mar, só faltando a finalização dos detalhes como parte elétrica, etc. Em comparação um U-Boat alemão levava seis meses para ser construído, e mais outros meses para ser certificado e incorporado à frota.

Um recorde que nunca mais foi batido foi o SS Robert E. Peary, um navio Liberty que foi construído em 4 dias, 15 horas e 29 minutos.

No total foram produzidos 2741 navios Liberty. Os 18 estaleiros conseguiram entregar 1,5 navios por dia. 2400 sobreviveram à Guerra, e o último Liberty em uso comercial foi aposentado em 1981. Nada mau para quem tinha 5 anos de vida planejada.

Hoje existem quatro navios Liberty ainda na ativa, como museus, dois estáticos, dois mantidos em condições operacionais.

Mais que um feito da indústria, os navios Liberty foram instrumentos de mudanças sociais. Como a maioria dos homens tinha ido pra Guerra, restou aos estaleiros contratarem a melhor coisa depois de um homem, uma mulher não essa frase não ficou legal.

Mulheres não só passaram a ser operárias e metalúrgicas, como previu Flashdance, como se tornaram especialistas em alta tecnologia. Ao contrário da construção tradicional, que dependia de rebites, os Liberty foram os primeiros navios construídos com chapas soldadas, e a mulherada aprendeu rapidinho.

A necessidade de mão de obra derrubava preconceito atrás de preconceito, os não só contratavam mulheres, como contratavam o grupo mais incontratável nos Estados Unidos dos Anos 40, mulheres negras. Uma mulher negra, Harriet Tubman, foi a única mulher a ser homenageada dando nome a um navio Liberty.

Stephen Hopkins, um dos signatários da Declaração de Independência dos EUA também foi homenageado com um navio Liberty, que em 27 de Setembro de 1942 havia completado sua primeira viagem, levando carga para a Cidade do Cabo, na África do Sul.

Na volta, no meio do Atlântico eles encontraram um cargueiro alemão, o Stier, mas o Stier não era um simples cargueiro. Era parte de uma estratégia suja, covarde e eficiente, como toda boa estratégia nazista: Ele era um caçador de cargueiros, disfarçado.

Local da Batalha

A tática era simples: Navios de carga, com uma boa quantidade de armas de grosso calibre camufladas seguiam pelas rotas comerciais, usando identificações falsas de navios aliados. Caso encontrassem algum navio inimigo, se aproximavam, com bandeiras e sinais amistosos, e abriam fogo.

O Stier

Foi o que o Stier fez, quando chegou a pouco mais de 1Km do SS Stephen Hopkins.

O Stier tinha em seu convés 6 canhões de 150mm, um canhão de 75mm, um canhão antiaéreo duplo de 37mm, quatro canhões de 20mm e inúmeras metralhadoras, além de dois tubos de torpedo.

Foi dada a ordem para o Stephen Hopkins se render, o procedimento era recolher prisioneiros e afundar o navio. Só que os navios Liberty não eram indefesos.

O Hopkins tinha um canhão de 50mm, dois de 37mm e 6 metralhadoras, todos operados por membros da Guarda Armada da Marinha. O resto da tripulação eram marinheiros mercantes.

Sob ordem do Capitão Paul Buck, o Stephen Hopkins começou a manobrar, enquanto todas as armas a bordo abriam fogo contra o Stier e seu navio de suprimentos, o Tannenfels, que também estava armado, mas menos que o Stier.

A batalha foi brutal, os dois navios combatiam como as velhas batalhas navais do tempo das fragatas de madeira, trocando tiros à queima-roupa. No Stephen Hopkins, as baixas eram imensas, logo os marinheiros da Guarda Armada ficaram sem substitutos, apenas para voluntários da tripulação civil correrem para ocupar as armas e continuar atirando.

Hamilton, John Alan; Last Stand of the SS ‘Stephen Hopkins’; IWM (Imperial War Museums);

O resultado, infelizmente, era inevitável. O Stephen Hopkins acabou afundado, a maior parte da tripulação morta, incluindo o Capitão Buck, mas eles não foram pro fundo do mar sozinhos. O Stier havia sido tão danificado que as equipes de reparos não conseguiram salvar o navio.

Com a tripulação transferida para o Tannenfels, o capitão deu ordem para afundar o navio.

O Stephen Hopkins havia se tornado o primeiro navio americano a afundar um navio nazista na Segunda Guerra Mundial, a um custo altíssimo. A tripulação de um Navio Liberty normal era composta de 38 a 62 civis, e 21 a 40 militares. Somente 19 em um bote salva-vidas sobreviveu.

Eles passaram um mês perdidos no Atlântico, sobrevivendo com água de chuva, rações e peixes, até que via um prodígio de navegação, conseguiram chegar à costa brasileira, quando foram resgatados.

O SS Stephen Hopkins foi agraciado com o Gallant Ship Award, um dos raros navios mercantes a receber a honraria. O Capitão Buck e o Cadete-Aspirante Joseph O’Hara receberam postumamente a Medalha de Serviço Distinto da Marinha Mercante. O’Hara, mesmo com quase toda a tripulação morta, correu para o canhão e conseguiu disparar quatro tiros certeiros no Stier, antes de ser fulminado por fogo simultâneo dos dois navios inimigos.

Eles também deram nome a outros navios Liberty, e em algo raríssimo, o Próprio SS Stephen Hopkins foi homenageado, batizando o SS Stephen Hopkins II.

Edwin O’Hara, municiando seu canhão de 4 polegadas. Pintura de W.M. Wilson, exposta na Academia de Marinha Mercante dos Estados Unidos.

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