Bertha Benz – O rolé que mudou o mundo

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A origem do automóvel consegue ser mais controversa do que a do avião, com veículos primitivos movidos a vapor, um monte de protótipos únicos que nunca chegaram nem na fase de patente. Assim, fica mais fácil e justo trabalhar com o conceito de quem primeiro conseguiu produzir um veículo minimamente usável, e com produção senão industrial, ao menos em série. Esse mérito coube a Carl Benz.

Em 1885 ele criou o Benz Patent Motorwagen, que sendo honesto era bem primitivo, mesmo para a época, mas Benz não começou do nada.

Apesar de ter nascido pobre, Benz teve a melhor educação que sua mãe viúva conseguiu prover, desde cedo ele se mostrou um prodígio e engenharia mecânica era sua vocação natural. Ele só não era muito bom escolhendo sócios, e depois de trabalhar em várias empresas, resolveu montar sua própria metalúrgica em 1871 com um tal de August Ritter, um picareta que deixou a empresa toda endividada.

Réplica do Benz Patent Motorwagen,

Em socorro a Carl Benz veio sua noiva, Bertha Ringer, que assim como as amigas daquele jogador famoso, também tinha um dote enorme.

Bertha comprou a parte de Ritter, e fez de tudo para botar a fábrica nos eixos. A verdade é que Carl era um engenheiro genial, um excelente marido cumpridor de suas obrigações conjugais (tiveram cinco filhos) mas era péssimo administrador. Bertha mantinha a fábrica administrada, enquanto Carl… inventava.

Isso ficou especialmente complicado quando eles se casaram, e Bertha (agora) Benz não podia mais ter créditos sobre as invenções da empresa. Não que isso impedisse Carl de inventar, sempre com ajuda de Bertha, e a ajuda era muito mais que apenas financeira. Claro, o dote (descomunal) dela ainda botava comida na mesa e graxa nas máquinas, mas ela viva entre o escritório e a oficina, acompanhando, sugerindo e testando as invenções de Carl, que aperfeiçoou idéias como velas de ignição, motores de quatro tempos, radiadores, carburadores, etc.

Em 1888 o carro de Benz já havia evoluído para o Benz Patent Motorwagen Modelo 3, mas automóveis ainda eram uma curiosidade. As “viagens” eram extremamente curtas, na maioria das vezes menos de 1Km, os veículos quebravam muito e ninguém achava que iriam substituir cavalos.

O Modelo 3

Carl Benz por sua vez ficava enfurnado na oficina, mexendo no projeto do Modelo 3, achando que ele não estava pronto para uso real, quanto mais ser vendido. Bertha foi perdendo a paciência, ela sabia que logo alguém apresentaria um automóvel funcional e os Benz perderiam os holofotes.

Como Carl nada fazia, ela perdeu a paciência, pegou um carro sem falar com o marido, arrastou dois filhos, de 15 e 13 anos e embarcou em uma viagem de mais de 100Km entre Mannheim e Pforzheim.

Lembre-se, era 1888, as Autobahns não eram exatamente populares, ou existentes, não havia infraestrutura de postos de gasolina. Aliás nem gasolina havia para vender fácil, o carro de Bertha era abastecido com Benzina, que ela comprava em farmácias pelo caminho.

O Modelo 3 não era exatamente possante. Seu motor produzia 2hps, com velocidade máxima de 16Km/h, no plano. Em ladeiras os dois meninos tinham que descer para empurrar.

Ladeira abaixo, a coisa piorava, o freio era uma alavanca de madeira pegando direto na roda, Bertha logo descobriu que ele rapidamente se tornava inútil. Ela teve uma idéia, parou em um sapateiro, pediu para ele pregar tiras de couro e inventou as primeiras sapatas de freio.

Ela desentupiu linhas de combustível usando alfinete de chapéu, usou uma de suas ligas como material isolante e consertou inúmeros outros pequenos defeitos durante a viagem.

Como a recepção 4G era horrível, Bertha não instagramou a viagem, então só restaram ilustrações.

Tendo saído ao amanhecer, os três chegaram à casa da mãe de Bertha em Pforzheim logo após o anoitecer. De lá ela telegrafou pro marido, avisando onde estava. Também telegrafou a história para vários jornais, que ficaram extasiados.

Um AUTOMÓVEL percorreu pela primeira vez uma distância considerada imensa, e com uma mulher no volante! (sendo justos não havia outros carros na rua pra ela bater)

Quando voltou para casa, alguns dias depois, Bertha Benz tinha uma lista de recomendações para aperfeiçoar o Modelo III. Carl ganhou a confiança que precisava para aceitar que o Modelo III podia ser colocado à venda, e o grande público fazia fila atrás daquele veículo incrível.

Ao contrário de tanta gente, Carl sempre foi imensamente grato ao apoio que obteve da esposa, e nem falo do descomunal (ui!) dote. Bertha não disputava holofotes, ela era sócia e parceira. O sucesso dos dois era o sucesso dos dois. Tanto que em suas memórias Carl escreveu:

“Apenas uma pessoa permaneceu comigo no pequeno barco da vida quando parecia destinado a afundar. Essa era minha esposa. Corajosamente e decididamente, ela lançou as novas velas da esperança.”

Carl e Bertha

A rota usada por Bertha foi batizada em 2008 como “Caminho Memorial Bertha Benz”, e percorre 194Km, ida e volta, com placas detalhando os vários passos da histórica viagem.

Sem sequer perceber Bertha Benz inventou dois conceitos fundamentais para a indústria automobilística: O Grand Tour, aquelas longas viagens de lazer onde a gente sai para dirigir pelo prazer de dirigir, sem focar no destino, e as longas tediosas e necessárias viagens de teste, quando os carros são testados e condições reais.

Um dos primeiros carros vendidos depois da aventura de Bertha foi para uma professora húngara, que não tinha Internet então não sabia que carro era coisa de homem.

Hoje Bertha, que morreu em 1944 é homenageada pela própria Mercedes-Benz como uma das criadoras do automóvel. O Desafio Bertha Benz é uma corrida semi-anual que promove combustíveis sustentáveis e alternativos.

Há vários monumentos e estátuas homenageando Bertha Benz, espalhados pela Alemanha, lembrando que nem sempre uma grande mulher fica atrás de um grande homem, às vezes ela deixa o cara na oficina e vai dar uns rolés com o possante.

Fontes:

PS: Este artigo é dedicado a outra alemãzinha porreta, Sabine Schmitz, que não só comprovou que mulheres sabem dirigir, como demonstrou que podem ser completamente maravilhosamente insanas, fazendo Nurburgring em pouco mais de 10 minutos, em uma VAN!

Adeus Sabine, obrigado por tudo.



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